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São Carlos (cidade natal), SP, Brazil
Sou formada em Psicologia pela UFU em 1996, fiz Aprimoramento Profissional em Psicologia Hospitalar pela PUC/Camp em 1998, formação de Educadora Perinatal pelo Grupo de Apoio à Maternidade Ativa em 2004, e Curso de Extensão em Preparação Psicológica e Física para a Gestação, Parto, Puerpério e Aleitamento pela UNICAMP em 2006, onde neste mesmo ano, participei da palestra "Dando à luz em liberdade - Parto e Nascimento como Evento Familiar" com a parteira mexicana Naolí Vinaver Lopez. O que é uma doula? Uma mulher experiente que serve (ajuda)outra mulher durante o trabalho de parto e o pós-parto. Fui doula por 18 anos. Sigo agora como psicóloga atendendo em consultório particular na Vila Prado em São Carlos-SP Contato: vaniacrbezerra@yahoo.com.br (16) 99794-3566

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Heloísa, Marcelo e Luísa – 23/06/2010

Heloísa entrou em contato comigo pela internet. Achou o meu blog e o da Dra Carla, e veio para uma oficina de parto, marcada num sábado de manhã. Acordaram cedo e viajaram de SJRio Pardo para São Carlos, especialmente para fazer uma preparação para o parto. 

Era a segunda gestação de Heloísa, e me lembro deles durante a oficina contando o primeiro parto e dizendo que no dia seguinte o Marcelo tinha tantas dores pelo corpo que mais parecia que ele tinha sido atropelado... então a Katrina deu uma atenção a eles no sentido de prestarem atenção à postura para não sobrecarregar a coluna e o pescoço. No final desta oficina toquei minha música de índio, pedindo aos casais que prestassem atenção às mudanças de ritmo e à transição de um ritmo para o outro.  A fase de transição no trabalho de parto é a que vai dos 7 aos 10cm. É uma fase onde as contrações se tornam mais fortes e duradouras e às vezes dá impressão de que não vai dar para aguentar. Mas é só dar tempo ao tempo e a mulher se acostuma a esse novo ritmo, que faz a dilatação evoluir um pouco mais rápido e ela passa então para o estágio expulsivo: o final da música.












Algum tempo depois recebi um e-mail da Heloísa: “conversei com o Marcelo e... você viria doular aqui em SJosé?”

Aí tenho que explicar... eu já tinha recebido algumas solicitações de doulagens em outras cidades e nunca aceitei. Motivos: eu não tinha carro, só tinha moto. Dentro de São Carlos, quando é necessário eu vou de táxi, mas ir de táxi para uma cidade vizinha fica entre 200 e 400 reais... enfim, ficava tão difícil que por mais que eu quisesse dar um jeito... Só que no caso da Heloísa tinha um facilitador. Eu morei em Guaxupé, cidade vizinha a SJRPardo, então meu marido poderia me levar e ir para Guaxupé enquanto eu estivesse doulando. Achamos que não seria tão difícil e então eu aceitei. 

Combinamos assim: eu precisava ir pelo menos uma vez antes do dia P para conhecer o caminho e a casa. Ficamos uma manhã inteira conversando e vendo filmes, e deixei outros filmes para eles assistirem ao longo da semana, fizemos o plano de parto, tudo numa tacada só. E fui conhecer o quintal, imaginamos onde poderíamos amarrar uns lençóis, etc... tudo combinado, depois da visita fui passar uma noite em Guaxupé e mandei mensagem para quatro gestantes que eu acompanharia, explicando que estava longe, para me avisarem a qualquer sinal de TP e eu voltaria. Todos me responderam que ficasse tranquila porque estava tudo bem, e dormi muito bem a noite toda. Voltamos a São Carlos no domingo a tarde.

Eu e Heloísa continuamos sempre em contato, trocamos e-mails sobre os detalhes do plano de parto e então passamos a aguardar que a Luísa quisesse vir para o lado de cá.

Pedi para a minha mãe me emprestar o carro dela nos seguintes termos: quando a Helo me ligasse, eu e Raul iríamos de moto até a casa da minha mãe (60Km) e então seguiríamos de carro. Dois dias depois ela me ligou e disse que ficou pensando... e se estiver chovendo, e se for de madrugada, e se estiver chovendo, frio e for madrugada? Póis é, existe essa possibilidade! Então ela preferiu me emprestar o carro e deixá-lo comigo até a Luísa nascer. Falei que poderia demorar cinco semanas e ela respondeu que não tinha importância! Que posso dizer? Essa mulher é uma mãe prá mim!

Então fiquei com o carro e enquanto isso nasceram os dois bebês da oficina em que Heloísa e Marcelo vieram, e mais dois bebês da oficina do mês seguinte, de modo que quando ela entrou em TP eu não estava com nenhuma outra gestante com mais de 38 semanas! Sair de São Carlos por dois dias foi super tranquilo!

A médica que acompanharia o parto da Heloísa era assim: super a favor de parto normal desde que não ultrapassasse as 40 semanas, no máximo 40s e 2 ou 3 dias... eu morria de medo dessa história, e tinha a impressão de que qualquer dia ia ligar para a minha mãe e dizer que ela podia vir buscar o carro pq já tinham feito a cesárea... eca, Deusnoslivre de médicos que fazem cesárea só pq passou de 40 semanas, amém! 

Mas a Heloísa era super confiante de que nasceria antes das 40 semanas e assim foi. Ela me mandou uma mensagem numa linda manhã, dizendo:

“BOM DIA! SAIU O TAMPÃO HÁ DEZ MINUTOS. 
CONTRAÇÕES FRACAS E RITMADAS. HELÔ”.

Perguntei sobre a duração dos intervalos. Resposta:

“MAIS DE DEZ”.
Pedi então para me manter informada.

“OK. QUANDO EFETIVAR ENTÃO EU TE LIGO. BJS”.

 Fiquei super em dúvida na hora de mandar meu filho para a escola depois do almoço, mas resolvi que passar lá para pegá-lo não faria grande diferença no tempo que levaríamos para chegar a S.José, e ele foi para a escola normalmente. Ficou a tarde toda, e enquanto isso eu deixei tudo pronto para sair, e depois arrumei uns cartazes e crachás para a sessão na câmera de vereadores, onde naquela noite seria votado o projeto de lei complementar sobre o direito de acompanhante de escolha da parturiente durante todo o trabalho de parto, parto e pós-parto na maternidade de São Carlos.

Já estávamos nos arrumando para ir para essa sessão quando a Heloísa me ligou dizendo que a médica fez questão de vê-la no final da tarde e apesar das contrações não estarem ainda próximas, quis fazer um exame de toque, que revelou 6cm de dilatação. Então entreguei tudo para a minha super irmã ativista, Andréia, e pusemos o pé na estrada. Chegamos à casa dela perto das oito, e foi ela mesma quem atendeu o interfone e abriu o portão, dizendo lá de cima da escada: “nossa, vocês chegaram rápido”! Pois é, meu marido sabe até os buracos desta estrada de cor e salteado! 

Então o Raul e o Felipe seguiram até Guaxupé e eu entrei para ficar com eles. Estavam tranquilos, me perguntaram se eu queria comer alguma coisa, conversamos sobre a viagem... a Heloísa estava com as contrações um tanto espaçadas ainda, cerca de cinco minutos, mas logo começaram a ficar mais duradouras. 













Ela caminhou pela casa, pendurava-se no pescoço do Marcelo, depois colocou a bola sobre a cama e reclinou-se sobre ela, descansando ali durante uma boa meia hora.



Esquentei água para a bolsa de água quente, e Helo não quis muita massagem. Só teve uma hora que queixou-se de um pouco de dor nos pés e aceitou um pouco de massagem ali, mas por pouco tempo. Logo quis andar de novo. Depois sentiu vontade de fazer xixi algumas vezes seguidas, e ficava um pouco sentada no vaso sanitário. Muitas parturientes fazem isso, a posição ajuda bastante a relaxar.

A família do Marcelo ligou algumas vezes para saber porque ainda estavam em casa e ele tinha o maior cuidado, dizendo com muita calma que iriam quando fosse a hora.

Perto das dez da noite a Andréia (minha irmã) ligou para contar que a lei complementar foi aprovada por unanimidade! Yes!

Algumas contrações mais próximas e mais fortes, Helô abriu bem os olhos, respirou fundo e disse: 
- “ISSO É A TRANSIÇÃO”!

Nem tenho como explicar a alegria de ver uma mulher saber o que está acontecendo e continuar no controle da situação ao invés de sentir medo. Saber que a cada contração seu bebê está mais próximo do lado de cá, concentrar-se e permanecer tranquila.

Então estávamos na parte onde a banheira pode ser de grande ajuda. Eu tinha levado duas banheiras para podermos encher uma na casa dela e não precisar desmontar tudo para levar para a maternidade. Mas nas últimas consultas de pré-natal a médica disse para a Heloísa que não haveria problemas em montarmos a banheira lá na maternidade, e ela inclusive ficaria mais tranquila. Sendo assim, ficamos mais um pouco em casa, e logo a Heloísa disse firmemente que preferia ir para a maternidade porque se as contrações ficassem mais próximas o trajeto até lá poderia ser muito sofrido. Então pegamos as malas e fomos, bem devagar. No caminho o Marcelo ligou para a médica e avisou que estávamos indo.

Quando chegamos a médica estava de pé na frente da entrada da maternidade e quando a Helô desceu do carro ela disse:
- “Graças a Deus vocês vieram, eu não estava mais aguentando de ansiedade”.

Achei aquilo péssimo, e tive que lidar de novo com a variável “médica que nunca viu doula”. Rsrsrsr Não demorou um minuto para ela me perguntar quanto estava a dilatação. Respondi que devia estar entre 7 e 10, mas eu não faço toque...

Fomos para o setor da maternidade, entrei sem problemas, e a médica disse no caminho que queria fazer um exame de toque. Eu fui junto com a Heloísa e o toque até que foi tranquilo, ela disse que a dilatação estava quase 10 e a bebê um pouco alta. Mas aí ela quis ver a cor do liquido, usou o parelho próprio para isso, e depois me perguntou se eu queria ver também. Nunca tive esse tipo de curiosidade, afinal se não vou ficar fazendo esse exame, ver uma vez ou outra não vai me acrescentar nada. Agradeci e recusei, e ela tirou o aparelho, ajudei a Helô a se levantar antes da próxima contração.

Então ela foi encaminhada para o apartamento onde ficaria e nessa hora o pessoal da enfermagem parecia um pouco indeciso devido a uma reforma que estavam fazendo no hospital. Tive a impressão de que no apartamento onde ela ficaria, quando entraram estava tudo empoeirado, então deram meia volta e a levaram para outro apartamento. Arrumamos as malas e eu abri minha bolsa de doulagem, tirei a bolsa de água quente e o aquecedor, esquentei água, depois inflei a bola. Heloísa ajeitou-se ajoelhada no chão e inclinada sobre a bola que estava colocada sobre o sofá, com a bolsa de água quente nas costas.

Bom... ela ainda não estava com a dilatação completa, então eu e Marcelo inflamos a banheira, eu coloquei o plástico descartável e começamos a carregar água do chuveiro para encher a banheira. Eu tinha levado 8metros de mangueirinha para não ter que carregar água, mas o chuveiro não era de mangueirinha! Rsrsrsr Pedi a uma enfermeira se tinham um balde para emprestar, e ela perguntou se eu não tinha nada maior do que aquele canecão (onde eu esquento água para a bolsa de água quente). Ridículo, mas eu fiquei com raiva dela. Eu tinha levado, banheira, mangueirinha, canecão, resistência para esquentar água, bola suíça, e mais uma pancada de coisinhas úteis, aí ela me olha com a maior cara de desprezo e pergunta: - “você não tem nada maior que isso”?!!!! Juro que fiquei com vontade de falar a maior coleção de palavrões que ela deve ter escutado a vida toda... e respondi com cara de poucos amigos... - NÃO!!!

Aí ela saiu para procurar e eu continuei junto com o Marcelo, carregando água do chuveiro. Daí a cinco minutos no máximo outra enfermeira abriu a porta e perguntou: 

- “Quem é a doula? Você pode vir aqui fora falar comigo por favor”?
R) Claro! (Imaginando qual seria a encrenca dessa vez)

A moça se apresentou falando o cargo que ela ocupa, cic, rg e número de matrícula, e perguntou:

- "Quem deu autorização para encher essa banheira no quarto"?

R) A médica nos disse que não haveria problema.

- "Pois é, mas eu sou a responsável por esse setor e eu não fui consultada. Eu não posso permitir uma coisa tão fora dos padrões deste hospital sem consultar primeiro a diretoria, porque se amanhã der algum problema com essa moça vão dizer que foi por causa da banheira e eu é que vou ser chamada lá para responder... além do mais o gasto de água quente do hospital para encher essa banheira”...

Fiz sinal com a mão que ela não precisava falar mais nada. Ela parou de falar e eu disse:

R) Não tem problema. A banheira ajuda muito mas ela não é fundamental.

- “Ah que bom... porque veja, este hospital não está preparado para atender partos humanizados”...

Respondi: - Não tem problema.

Virei as costas, entrei no quarto e fechei a porta. Fechei a torneira do chuveiro, falei alguma coisa para a Heloisa sobre não terem deixado usar a banheira, mas graças a Deus ela já estava na fase em que a única coisa que importa é colocar o bebê para fora. A médica apareceu para dar um alô, lamentou que não pudéssemos usar a banheira e comentou que tinha levado “um pito” da enfermeira. Deu um longo suspiro... pediu que avisássemos quando a bolsa rompesse porque ela achava que depois disso o nascimento seria rápido. E saiu.

Veio outra moça da enfermagem, com uma prancheta, dirigiu-se à Heloísa, que estava tendo contrações longas com intervalos de um minuto, e começou a fazer peguntas: nome? Telefone? Tem celular? É o primeiro filho? Como foi o primeiro parto? Já sofreu algum aborto? Tipo sanguíneo? Fator Rh? Já recebeu transfusões alguma vez? Já passou por alguma cirurgia? Endereço? É casa ou apartamento? Você sabe o CEP?

Juro que quando ela perguntou o CEP eu quis voar no pescoço dela! Como é que pode meu Deus? Quanta falta de sensibilidade, quanta falta de preparo... e esse tipo de atendimento é o que quase todas as mulheres brasileiras recebem... que vontade que me deu de pegar em armas e fazer uma revolução!

Bom, continuando, o CEP foi a última pergunta da mocinha perguntadeira, graças a Deus. E quando ela estava acabando de fazer suas anotações a Heloísa falou:

- “Rompeu a bolsa”.

Líquido claro, eu e Marcelo providenciamos uma toalha para Heloisa se ajoelhar em cima, o líquido continuou escorrendo, contrações mais doloridas, fiquei ali, colocando a bolsa de água quente nos intervalos, e arrumei uma toalhinha que molhava com água gelada que tinha no quarto, e ela limpava o suor do rosto.

A médica voltou, eu não falei nada. Achei que se ela voltou logo depois da bolsa ter rompido seria porque a mocinha perguntadeira tinha contado.

Mas algumas contrações e Heloísa falou:
- AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAi tá nascendo! Tá nascendo,tá nascendo, tá nascendo!

A médica olhou prá mim e perguntou:
-“Já rompeu a bolsa”?!!!!!
Respondi: - “ué, já, eu achei que aquela moça que estava aqui tinha avisado a senhora!”

Kkk...

Aí virou um clima de correria, e a médica chegou a dizer:
- “Vamos logo porque se nascer no quarto vai ficar muito feio”!

Tóin!  Fomos ajudando a Heloísa a ir em direção ao centro obstétrico, que não era perto, e ela estava com dificuldade de andar. Então eu e Marcelo fizemos uma espécie de cadeirinha, cada um segurando uma perna e ela se segurando nos nossos ombros. Confesso que fiquei com medo da posição facilitar a descida da bebê, e respirei aliviada quando chegamos à entrada do centro obstétrico. O Marcelo entrou junto com a Helô, e eu fiquei aguardando permissão para entrar também, o que demorou um pouco, depois me trouxeram um terninho tamanho P e eu estou mais para GG... então a moça da enfermagem foi com toda a boa vontade do mundo procurar um terninho maior no vestiário dos homens. Chegou, me vesti  e entrei com a máquina, a moça me pediu que eu ficasse na porta, sem entrar na sala de parto. Tudo bem!

Tirei algumas fotos, parto frank, Heloísa notou que o relógio da parede estava parado, como vamos saber a hora que nasceu? Acharam um relógio, Helô sendo orientada a fazer força, Marcelo do lado ajudando e incentivando. E foi assim que ouvimos o chorinho da Luísa pela primeira vez. Helô olhou pra mim com um sorriso que chegava até os olhos, a expressão da vitória que eu já vi tantas vezes, uma imagem linda de se ver!



Ah, aí chegou o pediatra, P da vida, falando alto, reclamando de ser chamado à pressas! Foi até o bercinho aquecido e examinou a menininha, reclamou mais um pouco e foi embora. Kkk!

Quando ele saiu eu sai também e fui até o quarto, desmontei a banheira, limpei e guardei tudo, e ela não demorou a vir para o quarto. Estavam super felizes, conversamos um pouco, o Marcelo me levou para a casa deles e voltou para a maternidade para ficar com a Heloisa.

Eu tive dificuldade de dormir, mesmo depois de tomar um banho e esperar baixar a adrenalina... fiquei muito preocupada sabem porquê? Era junho, e esse foi o segundo parto normal do ano naquela maternidade (do convênio). A enfermagem de lá não está acostumada a avaliar hemorragia pós-parto e isso pode ser perigoso... passei a noite toda com vontade de ligar lá para perguntar se estava tudo bem, se o sangramento estava diminuindo. Consegui dormir pouco antes de amanhecer o dia.

Mais um pouco e as funcionárias dela chegaram, me levantei e tomei banho, encontrei um café da manhã caprichado. Liguei para o Raul e contei como tinha sido. Heloísa estava feliz, isso é o que importa.

Falei que queria ir na maternidade antes de ir embora para São Carlos, e uma irmã do Marcelo foi me buscar e me levou até lá. Entramos sem dificuldades, e os encontrei muito sorridentes. Conversamos, tiramos fotos, e ganhei uma lembrancinha do nascimento: uma almofadinha cor-de-rosa, linda, que até hoje está na minha caixa de costura. (Ah, pensaram que eu não tinha uma?! Tenho sim! Sei fazer barras e pregar botões direitinho!)

Helô! Adoro você. Aceitei te doular não só pela facilidade de ser vizinha de Guaxupé. Foi porque você me cativou. Eu AMEI fazer parte desta história, adorei sua família, adorei o Plínio... adorei sua casa, enfim, tudo que vem de você eu adoro. Sou sua fã de carteirinha.

Um grande beijo a você, Marcelo, Plínio, Luísa, e bebê na barriga. Vocês formam uma linda família.
Vânia Doula.

Luísa com 1 aninho. Linda!




sábado, 18 de junho de 2011

Liriane, Valter e Arthur – 11/06/10

Liriane me contratou quando ainda tínhamos bastante tempo para a preparação, ainda bem! Enquanto algumas me procuram já com mais de 38 semanas, outras me procuram logo no começo da gestação e eu tenho que pedir para esperarem um pouco mais, peço que frequentem as reuniões do GAPN... Liriane acertou, me contratou na hora certa, e assim fizemos a preparação bem tranquilamente. Ela morava num bairro muito gostoso, não muito longe da maternidade onde pretendia ter o bebê, e eu gostava muito das tardes que passava na casa dela, vendo filmes e conversando sobre partos, e também falando sobre receitas vegetarianas, com cappuccinos cremosos para rebater o frio.

Ela estava às voltas com uma preparação para prestar um concurso, continuava dando suas aulas na faculdade, fazendo hidroginástica e yoga para gestantes, e ainda bordava o enxoval do bebê. Um verdadeiro poço de energia, e energia boa!

O que anotei de diferente no caso da Liriane: “ela acha que o bebê está sempre uma semana a mais do que o ultrassom diz”.

Conheci o Valter no dia em que fizemos o plano de parto. Digo fizemos, incluindo-me no processo, porque eu explicava ponto por ponto do trabalho de parto e ia anotando as preferências de cada casal que me contratava para acompanhá-los no dia P.

Fizemos uma oficina de parto quando ela já estava com quase 39 semanas (segundo o ultrassom), e quando eu disse algo como: “então nos vemos na oficina se até lá ainda não tiver nascido”, ela respondeu: “tenho certeza que só nasce depois da oficina”.

Também conversamos sobre as provas do concurso que seriam no fds em Ribeirão Preto, como seria viajar de volta caso rompesse a bolsa e/ou começassem as contrações... tudo bem combinado entre nós.

Fizemos a oficina em uma quinta à noite, e na sexta de manhã ela me ligou dizendo assim:
- “Ai Vânia, meu concurso... a bolsa rompeu...”

E eu, bem palhaça, respondi:

- Bem que você falou que nasceria depois da oficina! Rsrsrsr Bom, melhor assim do que você ir no primeiro dia e entrar em TP no segundo dia de provas...

As coisas estavam só começando, ficamos então aguardando que as contrações começassem. Estava um dia muito frio. Chamara-me no início da noite, meu marido me levou até lá, desejou boa sorte quando o Valter veio abrir o portão e foi embora.

Liriane estava na sala, calma, sorridente. Entre as contrações foi me contando como tinha passado o dia na companhia do chazinho de canela, a empregada estranhando ela não ir para a maternidade estando já com a bolsa rota...

Enquanto estávamos ali eu inflei minha bola suíça, e logo depois a Liriane passou a utilizá-la, sentindo-se melhor sentada na bola durante as contrações, e ali ficou durante algum tempo. As contrações já ficando mais fortes e bem mais próximas. Mesmo assim ela insistiu que eu fosse comer alguma coisa, depois o Valter, e ela aceitou um ou dois sachês de mel que tinham sido comprados especialmente para esta ocasião, tomou uns golinhos de gatorade e mordiscou umas bolachinhas. Eu lembro do Valter também se utilizando dos sachezinhos de mel como sobremesa! Rsrsr

Pouco depois as contrações ficaram beeeem fortes, Liriane manifestou dor intensa, então fiz massagens e coloquei a bolsa de água quente. Ela mudou de posição, quis sair da bola, ajoelhou-se no chão e reclinou o corpo apoiando-se no sofá, e a contração foi looooooonga. Logo depois outra, looooooonga, com muita dor. Então achei que já era hora de ir para a maternidade. Começamos a colocar as coisas no carro e depois fomos devagar até a maternidade. Chegando lá entrei com ela enquanto o marido ficou preenchendo a ficha, e quando a enfermeira plantonista veio atendê-la, avisei que a bolsa estava rota. Ela então não fez um exame de toque e sim colocou o espéculo e olhou a dilatação. Isso foi muito dolorido, como sempre é para mulheres em trabalho de parto que precisam se deitar para o exame... aí a enfermeira me chamou lá fora, e disse:
- “Vânia, eu não sei nem como dizer... ela está no máximo com 1cm de dilatação, é melhor vcs voltarem para casa”.

Ok. Voltei para a sala de exame e falei com eles, pois o Valter já tinha entrado. Eu disse a eles que a dilatação estava menos de 4, então... pedi desculpas e expliquei que era melhor voltar para casa.

Infelizmente um erro destes tem um custo emocional muito alto. Ir para a maternidade gera incomodo, o exame foi muito dolorido... então na volta ela disse que se toda essa dor que já tinha passado não tinha dilatado nem 4 ainda, será que conseguiria aguentar?

Fui apoiando, incentivando, chegamos de volta à casa dela, e ela foi direto para o banho quente, enquanto eu e Valter tiramos algumas coisas do carro, incluindo o aquecedor, que tinha sido levado para a maternidade e trazido de volta. Ele ligou o aquecedor e eu fui ver como ela estava lá no chuveiro, logo ele chegou e ficamos ali, água quente caindo nas costas, muita dor, contrações longas...

Senti um cheiro estranho. Parecido com querosene. Sai no corredor e o cheiro estava mais intenso, fui até a sala e vi fumaça. Era o aquecedor, praticamente pegando fogo. Puxei o fio da tomada e fui chamar o Valter, ele foi até lá e conseguiu, não sei como, pegar o aquecedor e levar para fora. Abriu todas as portas e janelas para a fumaça sair, e nós fechamos a porta da suíte para ficarmos mais protegidos do frio.

Acho que conseguimos ficar em casa mais uma hora e meia, mas os alívios não farmacológicos disponíveis não estavam sendo suficientes e Liriane deixou claro que não estava mais aguentando, queria cesárea. Conversamos um pouco até eu ter certeza, e a decisão estava mesmo tomada.

Então enquanto Valter a ajudou a se preparar para voltar para a maternidade eu liguei para a Dra Carla e expliquei:

- “Carla, o nível de dor que ela sente é muito alto, eu pensei que a dilatação estaria avançada, nós fomos até a maternidade e ela estava com 1 cm de dilatação! Voltamos para casa mas agora ela não está mais aguentando”...

Quando desliguei o telefone e voltei para a sala a Liriane disse:
- “1cm?!!! Se você tivesse falado eu tinha pedido a cesárea naquela hora!”
Pois é... tentei ajudar, mas de bem intencionados...

Então fomos indo para a maternidade, e como sempre acontece quando se toma a decisão pela cesárea, as dores parecem ficar ainda mais intensas. É como se a dor perdesse todo o sentido, pois se não vai nascer por baixo... fica bem mais difícil de suportá-las. Quando estávamos quase chegando na maternidade ela pediu que o Valter parasse o carro porque ela estava com ânsia. Abriu a porta para vomitar e eu desci do outro lado para ajudar, fui até ela, segurei o cabelo, tentei proteger o vestido mas não consegui... quando ela melhorou eu quis dar a volta correndo no carro e levei um baita tombo. Torci o pé com tanta força que pensei que tinha quebrado o tornozelo. Imaginei toda a cena deles tendo que seguir sozinhos até a maternidade e eu ficando ali sentada na calçada esperando o resgate! Rsrsrsr... (quanto exagero!) Então me obriguei a levantar e consegui entrar no carro e fechar a porta. Só faltava dar a volta no quarteirão para chegar à maternidade.

Quando chegamos eu consegui colocar o pé no chão e apoiar o peso nele, então tive certeza que não tinha quebrado apesar da BAITA dor que eu estava sentindo. Lembrei do episódio do Friends que tem o parto da Rachel... uma cena em que o Ross bate a cabeça e diz olhando para ela: “você não tem idéia de como isso tá doendo!” enquanto ela está tendo uma contração.  rsrsr

Entrei com a Liriane na maternidade, a Dra Carla já estava ali pelo corredor, e perguntou se ela aceitava mais um exame de toque, só para ter certeza de que não estava próximo de nascer...

Liriane abraçou a Carla e falou que estava com vergonha, mas não estava aguentando... pediu desculpas pelo vestido sujo...  chorei também!

Conversamos nós 3, mais o Valter que logo chegou, o exame foi feito e ela estava com 4cm. Eu achei até uma evolução boa: 3cm em uma hora e meia... mas ela não aguentava mais.

Então ela foi para a cesárea, e eu fui junto para fotografar. 



A cesárea foi tranquila, anestesista bom, logo Liriane pode ver a carinha do Arthur. Lindo! E nasceu com a cabecinha comprida, típica do bebês que nascem de parto normal.














Valter teve autorização para ficar na janelinha, e depois de concluída a cirurgia ele entrou também. (Nós dois pagamos a taxinha de paramentação).

Arthur recebeu as ondas de ocitocina, escolheu o dia do seu nascimento e foi recebido com amor. Depois do nascimento Dra Carla e a pediatra comentaram que quando crescesse ele só ganharia um presente pelo aniversário e dia dos namorados. Mas alguém disse que não: quem dá só um presente são os homens. A mulheres são bem capazes de dar 3 presentes! Rsrsrsr
Fiquei com ela até estarem no quarto, acho que o Valter foi até em casa buscar alguma coisa e eu fiquei até ele estar de volta. Arthur logo foi trazido e amamentado, Liriane sorridente, apesar do cansaço. Até se lembrou de me pedir que escrevesse algo no livro de visitas que ela tinha preparado. E conversamos um pouco sobre religião, posto que compartilhamos o modo de entender a espiritualidade.

Quando o Valter chegou de volta fez questão de me levar para casa, apesar d’eu insistir que não era necessário... e se me lembro bem, depois ele teve dificuldade para conseguir entrar novamente na maternidade.

Quando fui à visita pós parto, Liriane me recebeu tranquila. Comentou que seu maior medo era o que realmente aconteceu – ir cedo demais para a maternidade. Mas quanto a isso assumo totalmente a responsabilidade. Sem fazer exame de toque eu tenho que me basear no ritmo e duração das contrações, intensidade da dor e comportamento da mulher. Tudo me levou a crer que ela estaria com dilatação avançada... mas errei. E ela me perdoou.

Contou dando muita risada do dia em que foi levar o Arthur para fazer o exame do ouvidinho, de que desceu do carro toda atrapalhada, carregando o bebê, a bolsa dela, a bolsa dele, e tentando cobri-lo com a mantinha porque estava frio. Aí entrou no consultório com tudo meio despencando, descabelada pelo vento, e viu todas aquelas mães arrumadinhas, parecendo comercial de margarina... haaaaaaaaaaaahahahah Para conseguir ficar arrumadinha numa situação dessas só com muita prática, talvez no quarto ou quinto filho! Só de conseguir descer do carro e carregar isso tudo menos de 10 dias após uma cirurgia abdominal, prá mim Liriane já merecia o prêmio “mãe do ano”!

Liriane, espero que tenha gostado das lembranças. Sei que não teve o final que você esperava, mas como você mesma disse na época: preparação física tinha, não engordou demais, tinha doula, foi à oficina de parto, estava com a melhor médica da cidade... o que mais poderia ter feito?! Limiar de dor não muda. A única coisa que poderia ter feito diferença seria ter a anestesia peridural disponível, mas infelizmente São Carlos ainda não chegou neste nível de excelência. Você foi grande o quanto pode. Ficou em casa tranquila, aguardou o início das contrações, e aguentou bastante. Tudo que posso dizer é que te admiro muito.

A você e sua família, obrigada por terem me chamado.  Eu adorei fazer parte desta história.

Valter, parabéns pelo companheirismo demostrado durante o TP. 
Vocês foram um casal lindo de se ver.


Arthur, bem vindo a esse lindo mundo. 
Que sua vida seja cheia de boas emoções.



Um grande beijo,
Vânia Doula.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Moça bonita

O começo dessa história... provavelmente eu já os tinha visto nas reuniões do GAPN, mas me lembro da primeira vez em que os enxerguei de verdade. Meu marido me levou de moto para mais uma reunião, e quando desci da moto vi o casal super sorridente que estava ali na frente. Quando tirei o capacete o rapaz falou olhando prá mim: “ê moça, você tá famosa!” e ela riu. 

No dia anterior tinha acontecido a audiência pública na câmera de vereadores de São Carlos, e o assunto era o descumprimento da lei federal que dá o direito a parturiente de escolher o acompanhante que estará com ela durante o parto, desde a internação até 24horas após o nascimento do bebê. Nós do GAPN comparecemos, e eu acabei falando bastante! Então... eles estavam rindo das coisas que eu falei demais, das coisas que falei de menos, de uma mulher que pediu a palavra e desceu o verbo no atendimento da Sta Casa, o que não tinha ligação direta com o tema em pauta... mas também foi interessante porque também ela tinha registrado uma queixa que desapareceu misteriosamente... então... eu fui lá e registrei minha indignação por alguns anestesistas se sentirem no direito de proibir a entrada do acompanhante, simplesmente porque não concordam com a lei! Como assim?! Então se eu não concordar com a cobrança de um imposto eu posso deixar de pagar? Bom... parece que os médicos, especialmente os anestesistas que trabalham em São Carlos só precisam cumprir as leis com as quais concordam!

Essa situação absurda mudou desde então, graças ao nosso trabalho e o acolhimento das denuncias por um vereador, que nos acompanhou em nossa batalha, chamou a audiência pública e depois apresentou um projeto de lei complementar à lei federal em questão. Vou falar mais sobre isso em outro post.

Continuando...

Eu fui proibida de entrar na maternidade no dia seguinte a audiência, e deu um baita trabalho até voltarem atrás. E eu estava exatamente neste clima de embate pelo bem, já que eu simplesmente não consigo aguardar que as coisas se resolvam por si só e boto a boca no trombone, quando o casal me contratou e comecei ir à casa deles. Tínhamos que tomar cuidado senão o assunto “militância pela humanização” predominava sobre todos os outros e os dois me escutavam tanto quanto eu a eles. E foi assim, nesta atmosfera de luta pelos direitos, que fomos nos aproximando do dia P.

Ah, nós tínhamos também uma afinidade religiosa, e às vezes a reunião de preparação acabava e continuávamos a falar sobre música, atitudes frente à vida, compreensão da influência dos fluxos de energia nos acontecimentos aparentemente desordenados, etc...



Eu tinha doulado a Mônica na noite anterior, mas tinha sido um parto bem rápido, de modo que eu não estava cansada. Mesmo assim dormi cedo naquele dia, e acordei às 3 da manhã, assim, do nada... Perdi completamente o sono, mas fiquei quieta na cama para não atrapalhar o sono do meu marido e meu filho. O celular tocou às 5 e era o rapaz, dizendo que a moça bonita estava em trabalho de parto, já com as contrações se aproximando, e ela já estava pedindo que eu fosse para lá. Quando cheguei,  ele me contou que acordou às 3 da manhã e ela não estava no quarto. Foi procurá-la e a encontrou na sala, tendo uma contração. Começaram a monitorar os intervalos e a duração das contrações, fizeram um chá, ela tomou um banho... e então, às cinco decidiram me chamar. Estavam super tranquilos, encontrei-a na sala, sorridente, estava tudo indo muito bem. Esquentei água para a bolsa de água quente, fiz massagens... lembro-me que ele observou que eu alinhava meu corpo com o dela quando vinham as contrações. Nunca reparei nisso, nunca fiz de forma consciente, mas acredito que sendo a minha intenção me aproximar e ajudar, o alinhamento energético acontece naturalmente.

O dia logo amanheceu, ela estava cansada, tentou deitar-se um pouco e quando vinham as contrações se levantava. Apaguei as luzes do quarto e esse esquema deu certo durante algum tempo. Depois ela quis ir para o chuveiro de novo, tomou um banho longo, e começou manifestar vontade de ir para a maternidade. 

Falei que achava que era um pouco cedo. Fui fazer mais um chá, esquentei água de novo para a bolsa de água quente, e mandei uma mensagem para a Dra Carla avisando que eu estava na casa da moça bonita e ela já estava querendo ir para a maternidade. Tudo bem, ficamos tranquilos. Dra Carla nessa época ficava na maternidade durante algumas manhãs, com os alunos do curso de medicina da UFSCAR, e nesta manhã ela estava lá.

Perto das oito e meia da manhã a moça quis mesmo ir para a maternidade. Estava muito preocupada com o aumento do tráfego na área onde mora, com a aproximação do horário de abertura do comércio, às 9h00, e então colocamos as coisas no carro, que já estava na rua, e fomos, com muita calma.

A chegada foi tranquila, ela foi levada para o quarto que já estava montado, e o exame de toque foi feito com ela sentada na banqueta de parto. Para minha completa surpresa a enfermeira informou que a dilatação estava completa e agora só faltava o bebê encaixar e descer. Então tínhamos tempo para encher a banheira e utilizá-la como fonte de alívio para o desconforto dessa fase final. Fui até o carro buscar a minha banheira, menor do que disponível na maternidade, recém-adquirida especialmente para os dias mais frios, pois assim seria mais rápido enchê-la e mais fácil manter a temperatura adequada para o nascimento na água, se esse fosse o desejo da parturiente. Quando estava voltando para dentro da maternidade encontrei o Fábio, da doulagem do dia anterior, entrando com um balde onde dariam o primeiro banho no bebê deles. Entrei com aquela expressão de felicidade de quando vemos mudanças que foram tão esperadas acontecendo! Os dois pais se cumprimentaram, e lá fui eu correndo inflar e encher a banheira para a moça bonita.  Encontrei Dra Carla no corredor, e ela disse algo como: “não teve jeito de ficar mais um pouco em casa?” e eu respondi: “Carla, eu errei, a dilatação já está completa! Eu nunca poderia imaginar, ela deve ser muito forte para dor!”

Carla então ficou super feliz e foi lá no quarto dar um oi para a moça, disse que estava por perto, e saiu para continuar atendendo seus alunos, a enfermeira plantonista viria a cada quinze minutos verificar o bem estar fetal, e aguardaríamos a descida da bebê.

Enquanto eu estava arrumando isso o casal estava no quarto, o clima era de confiança e felicidade.  Quando a banheira ficou pronta, forrada com o plástico descartável, e cheia de água quentinha, a moça entrou, apagamos as luzes, lamentamos a falta de um meio de escurecer o quarto numa manhã tão ensolarada... mas ela conseguiu relaxar e ficou ali durante um tempo.  Depois saiu, andou um pouco, ficou de cócoras durante as contrações, sentou-se um pouco na banqueta, andou de novo, voltou para a banheira, saiu da banheira... e a bebê continuava sem completar o giro. Não estava voltada nem para a frente nem para trás, e sim, olhando para o lado, única posição impossível de nascer. E já tinham se passado três horas. Os ânimos começavam a desanimar... sugeri ao moço que fizesse suas orações, e ele prontamente sacou duas velas, foi para o banheiro, acendeu e começou a rezar. Depois de algum tempo ele me chamou “para ver uma coisa”. As duas velas eram iguais. Colocando a mão acima delas, uma irradiava muito calor e a outra quase nada. Enquanto uma mão ficava a uns 10cm da chama da vela, a outra a mão eu quase encostava na chama e não queimava! Eu olhei pra ele absolutamente espantada, ele ficou sério, continuou rezando, e alguns minutos depois a Dra Carla disse: “eu não sei o que vocês fizeram, mas a bebê completou o giro e se posicionou corretamente. Agora é só esperar mais um pouco”.

Então esperamos, novamente confiantes.

Mas as coisas continuaram não evoluindo... e algum tempo depois a moça e Dra Carla concordaram em romper a bolsa artificialmente para ver se alguma coisa mudava. O líquido saiu com um pouquinho de mecônio, mas beeeeem pouquinho, e bem diluído. Lembro que a moça olhou, olhou para a Dra Carla, e no olhar de ambas estava a tranquilidade. Ela se levantou e andava pelo quarto, ficava de cócoras durante as contrações, segurando na cama.

Nada...

Sugeri que fizéssemos a pressão nos dois lados do quadril para tentar ajudar. Eu empurrava de um lado e o marido do outro, e ela forte, valente, aguentando e fazendo o que podia para ajudar sua bebê a descer.

E nada...

Então, perto das duas da tarde veio a decisão pela cesárea. Decisão que foi aceita pela moça, mas não compreendida, não desejada, simplesmente aceita. Enquanto ela foi preparada e levada para o centro obstétrico eu fui com o marido até a recepção pagar a taxinha de paramentação, e deram um recibo. Achei tão incrível darem um comprovante de uma cobrança  ilegal que fotografei o recibo. Depois o casal contou que deram muita risada quando estavam vendo as fotos... “isso só pode ser coisa da Vânia”. Pois é, militante em ação... mas nunca fiz nada com a foto, já não sou a mesma! Acho que resolvi tentar aprender a comer pelas beiradas...

Continuando: na hora de acompanhar a cesárea o moço resolveu não ir. Achou que poderia ficar nervoso e falar demais, sei lá... preferiu aguardar no lado de fora. Então peguei a câmera fotográfica e fui ficar com ela. Coloquei o terninho verde e fiquei aguardando autorização para entrar na sala onde ela estava. Entrei, expliquei a ela que ele tinha preferido ficar lá fora, ela já estava chorando antes disso... Logo Dra. Carla mostrou a ela a sua garotinha, e depois do nascimento a moça deixou suas lágrimas correrem. Melhor assim sabe? Melhor deixar a dor sair, não adianta fingir que não é nada e que o importante é que ambas estão bem. Claro que isso também é importante, mas se está triste e tem vontade de chorar, ninguém deveria dizer “não chora não, está tudo bem!”. Não está tudo bem!

Mas vai ficar. É preciso dar tempo ao tempo, digerir o acidente, limpar as feridas... e um dia a cicatrização se completa.

Fiquei com a moça até ela ser levada para o quarto e estar recebendo as visitas dos familiares. E fui à casa deles alguns dias depois, me lembro que nos sentamos à mesa e tomamos um café da tarde enquanto conversamos sobre o parto. Fiquei bastante.

Uma vez contei de uma doulagem onde eu rezei muito pela moça antes do parto. Por essa moça que doulei neste dia eu rezei muito depois do parto.  O processo de cicatrização emocional da cesárea foi relativamente longo. Mas aqui acho pertinente fazer uma observação: a depressão pós-cesárea foi muito sofrida de curar porque ela foi o canal de cura para outros problemas anteriores, e o sentimento de estar morando longe de mãe/pai e irmãos e não poder contar com a ajuda direta deles durante muito tempo sem lhes atrapalhar a vida, etc... tudo isso teve que ser trabalhado durante a cura da depressão pós-cesárea. E lá no final deste processo a moça bonita saiu mais forte e muito mais dona de si e da sua vida. 

Quando vier um outro bebê, outra gestação, outro parto, ela provavelmente estará menos gatinha e mais onça. Porque felizmente não há sofrimento que não nos ensine lições preciosas, e essa moça com certeza as compreendeu.



Encontrei o casal em dezembro, ela já tinha voltado a trabalhar, a rotina deles bem estabelecida, a amamentação mantida, tudo perfeitamente saudável, e o mais importante: ambos muito felizes e com um bebê sorridente no colo.

Eu, como sempre, sinto-me muito honrada por ter sido convidada a frequentar a casa deste casal e fazer parte desta história, de dor e superação, exatamente como em qualquer parto/nascimento. E continuarei sempre à disposição, ainda que a distância!



Um graaaande beijo, 

Vânia Doula.
  

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Mônica, Fábio e Tiago – 08/06/2010

Conheci o casal nas reuniões do GAPN São Carlos, sempre assíduos, atentos. Me lembro particularmente de uma reunião onde falamos sobre o banho de balde para acalmar os recém-nascidos, a utilização deles para aliviar as cólicas... Monica não pode ir à reunião por estar gripada, mas o Fábio compareceu e depois contou tudo a ela.

Quando me contrataram fizemos a preparação com bastante tempo, eu ia uma vez por semana, eles me recebiam logo depois de chegarem do trabalho, colocavam comidinhas e suquinhos na mesinha da sala, e ali assistimos os filmes e tiramos dúvidas. Ah, eles estavam com um filhote de gato bem novinho, procurando alguém que o adotasse, e eu bem na fase de procurar um cachorrinho para o meu filho que já tinha seis anos e tinha muito medo de cães... de qualquer forma o que meu filho queria era um animalzinho de estimação, e quase que fiquei com o gatinho! Mas me demorei na decisão e quando quis ficar com ele a Mônica já tinha se apegado a ele... moral da história: dormi no ponto, perdi o gato! Haaaaaaaaahahahh

O que eu anotei de peculiar durante as reuniões na casa deles: 1) IMPORTANTE: ela quer parto na água. 2) O Fábio nasceu de cesárea com hora marcada, e a mãe da Monica até entrava em TP e tinha algumas contrações, aí já ia e fazia cesárea. A família de ambos achava meio estranho essa idéia de parto natural. (Para que sofrer?!)

Bom... eu tenho um tanto de medo quando a família é contra, especialmente quando a mãe da moça é contra. Parece uma praga que na maioria das vezes pega! 

Sugeri que eles fizessem uma vivência: música suave, relaxamento, e se imaginar nascendo de parto normal. Assim: imagine que você não nasceu com hora marcada, que você começou a se sentir sem espaço, sentia muito sono a maior parte do tempo, aí começaram as contrações e você foi sendo empurrada(o) para fora... imagine a pressão na cabeça e depois passando pelo corpo todo, você rodando para nascer... enfim, imaginem com o máximo de detalhes possível como foi o dia do seu nascimento sem hora marcada, você sendo colocada(o) nos braços da sua mãe...

E eles fizeram direitinho. Lembro que demos risada pq quando foram fazer ficaram em dúvida se deveriam se imaginar como adultos ou como bebês... aí decidiram que seriam bebês, e acharam a vivência interessante. Perguntei se tinham tido algum sonho meio esquisito depois da vivência e responderam que não. Então... 1) tiveram facilidade de realizar a vivência, não ficaram intelectualizando a minha sugestão e imaginando se não seria ridículo ou perda de tempo. Simplesmente fizeram. Acharam agradável. E não tiveram nenhum sonho esquisito depois. Que acham do prognóstico? Uhu!

Bom, preparação completa, Mônica entrou em TP cinco dias antes de completar 40 semanas. Ligaram-me no final da manhã avisando que ela estava com contrações espaçadas. No meio da tarde ligaram de novo avisando que iriam fazer o ultrassom que estava marcado para aquela tarde e logo depois iriam à maternidade para ela tomar o antibiótico indicado para os casos de strepto positivo.
17h00 recebi a seguinte mensagem do Fábio:  contrações a cada 10 minutos, com 1 minuto e meio de duração. Ela vai tomar o antibiótico e depois voltamos para casa.
17h30: Ela está tomando o antibiótico, vai demorar mais uns 20 minutos. Teve 4 contrações com intervalos de 5 minutos, e está tendo uns tremores. É normal?

Respondi que sim, às vezes acontece, faz parte do precesso, está tudo bem.

Enquanto isso desmarquei meus compromissos, arrumei a mochila com as coisas de doulagem.

Chamaram pouco tempo depois, e eu fui rápido, meu marido estava em casa, e chegamos logo. O pai dela estava na calçada andando de um lado pro outro, quando cheguei me receberam um pouco apreensivos, indicaram que ela estava no chuveiro. Encontrei-os ambos dentro do box, água caindo nas costas, Fábio amparando e fazendo massagens, ela estava tendo uma contração e segurando no pescoço dele. Quando me viu disse que estava cansada, e eu prontamente fui pegar a bola suíça para que ela pudesse se sentar. Mas já veio outra contração e ela disse: “parece que eu já estou sentindo a cabecinha descendo”. Perguntei: posso olhar? E ela respondeu: claro!

Me abaixei e olhei, e tinha uma bola saindo... como eu não faço toque, tenho que confiar no que estou vendo, e o que eu vi foi a possibilidade do bebê nascer dentro da bolsa. Bom... levantei e falei que era melhor ir para a maternidade, com calma. Eles começaram a sair do chuveiro, eu fui até a sala e liguei para a Dra Carla, esperei tocar só 5 vezes, ela não atendeu, e Monica já estava tendo outra contração. Fui até eles, fiquei perto até a contração passar, depois voltei para a sala e liguei para a maternidade. Enf Gabriela atendeu. Expliquei que estava indo com um casal para a maternidade e não tinha conseguido ainda falar com a Dra Carla. Pedi a ela que chamasse então a Dra Carla e Dra Patricia, e que eu iria com o casal o mais rápido possível, maaaaas... “duvido muito que dê tempo de chegar”.

A família dela colocando as coisas no carro, Fábio tirando o carro e ela vindo pelo corredor comigo acompanhando... abri a porta para ela sair, mas quem saiu correndo primeiro foi o gato!

Peeeeeeeeeeeega o gaaaaaaaaaaaaaaaatooooooooooooooo!

Eu não sabia se ria ou se chorava, completamente ignorante que sou na arte de criar gatos dentro de casa, abri a porta na maior inocência! Sorte que alguém que estava próximo ao portão agarrou a gato fujão e o trouxe de volta para casa.

No carro só nós três - o Fábio dirigindo, Mônica e eu no banco de trás. A família dela foi em outro carro. Ela foi o trajeto todo ajoelhada no banco e segurando no encosto de cabeça. Quando dava contração ela resmungava que a bolsa estava demorando muito para romper, pq não rompia logo?!

Engraçado que de cada trajeto até a maternidade eu fico com uma cena especial gravada na memória, e no caso deles foi a volta na marginal perto da USP. Lembro com clareza dela tendo uma contração enquanto dávamos a volta naquela creche que fica na beira do rio...

Chegamos na maternidade bem na hora da visita da noite, perto das 19h30. Um monte de gente encostada na recepção esperando a hora de entrar, e nós passamos meio rápido no meio de todo mundo, a enf. Gabriela já estava por ali e Monica estava com um pouco de dificuldade de andar. A recepcionista sacou uma cadeira de rodas que nem vi de onde apareceu, Monica se sentou e inclinou o corpo prá frente, e eu fui com ela para o setor do convênio, confesso que com um pouco de medo de que a cadeira capotasse prá frente, então eu empurrava ao mesmo tempo que agarrava nos apoios das mãos para segurar se fosse preciso. É tão engraçado lembrar disso depois! Como é que se empurra e segura com força ao mesmo tempo?!

Fiz a curva no final do corredor e avistei Dra Carla e Dra Patricia, ambas sorridentes e já de terninho verde, o quarto todo preparado. No intervalo da contração Mônica desceu da cadeira e sentou-se na banqueta de parto, o Fábio chegou e me entregou a câmera fotográfica, e lá veio outra contração.

Dra Carla falou que não era a cabecinha, era a bolsa que estava aparecendo, mas a dilatação estava completa e o bebê bem baixo. O nascimento seria rápido. No intervalo o Fábio perguntou: e a banheira? Resposta: não vai dar tempo!

Daí para a frente Monica mudou de posição algumas vezes, procurando uma que fosse mais confortável porque não conseguiu relaxar na banqueta, e continuava perguntando: "pq a bolsa não rompe logo"?! 

Ela ficou de pé apoiada no Fábio, depois foi se abaixando, e o Fábio abaixou junto, ficou o tempo todo bem do lado dela. E eu filmando... - a bolsa rompeu, Dra Carla comentou: - prooonto o que vc queria já aconteceu! - e eu pensando se faria falta a banheira porque ela tinha deixado tão claro que queria o parto na água... pensei que talvez colocar a banheira para encher não fosse má idéia, o som da água poderia ajudar a Monica a relaxar.

Veio mais uma contração e ela se ajeitou com as mãos no chão, que estava forrado com lençóis limpos, e tentou relaxar, mas durante as contrações ela trancava os dentes... larguei a filmadora no chão, apontada para o lado dela, a abracei e comecei a falar no ouvido dela: coragem Monica coragem, coragem, coragem, coragem...

Veio uma contração e ela abriu bem a boca, Dra Carla falou: 'tá nascendo'! E eu continuei com o mantra: coragem, coragem, coragem... 

– 'Nasceu'!

Monica deu um grito! - “Ai MEU DEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEUS”!

Aí vocês vão rir muito de mim, mas eu pensei que com um grito desse a laceração só podia ter sido enorme!

Dra Carla tentou passar o bebê por baixo das pernas dela, Monica disse que estava com medo de pegar, eu olhei para ver se ela estava pegando ele com as duas mãos e vi uma volta de cordão. Então Dra Carla desfez a volta e aí Monica conseguiu pegá-lo, sempre sorrindo muito.

Prontamente peguei a filmadora de volta e registrei os primeiros momentos da família reunida. A placenta saiu logo, a equipe da maternidade deu uma limpada geral no quarto e a família dela recebeu permissão para entrar, mas aí tivemos exatamente o mesmo problema do parto anterior. Assim que acabou o horário de visita a recepcionista fez questão de me colocar prá fora... Mas a Monica estava muito feliz, muito tranquila, seu bebê aninhado em seus braços... ela me olhou e disse: - “Pode ir Vânia, vai tranquila. Aqui está tudo bem”!

Fui a casa deles alguns dias depois e fiquei sabendo de mais alguns detalhes: 1) o grito foi de pura emoção, e não teve nadinha de laceração. Que benção!
2) o bebê nasceu muito próximo da marca dos 2kg, e houve uma certa apreensão de que com a perda de peso que já é esperada nos primeiros dias ele não pudesse ter alta até que ganhasse peso novamente, mas isso não aconteceu (ele  não ficou abaixo dos 2kg) e tiveram alta normalmente.

Eles tiraram umas dúvidas sobre o banho de balde, sobre como enrolar a fralda no corpinho dele para facilitar o relaxamento do bebê. E pronto! 



Ganhei dois presentinhos/ lembrancinhas do casal. Uma bonequinha japonesa que guardo com muito carinho, e um Daruma, que tinha um significado muito especial na vida do casal, e agora tem na minha vida também. Na minha casa nova, os dois presentes ficam no meu cantinho especial. Adoro! Assim como adorei fazer parte dessa história. A lembrança do sorriso e da tranquilidade da Mônica continua iluminando meus dias.



Monica e Fábio, muito muito obrigada por terem me chamado!
Tiago,  seja sempre bem vindo!
Um graaaaande beijo,
Vânia Doula.