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São Carlos (cidade natal), SP, Brazil
Sou formada em Psicologia pela UFU em 1996, fiz Aprimoramento Profissional em Psicologia Hospitalar pela PUC/Camp em 1998, formação de Educadora Perinatal pelo Grupo de Apoio à Maternidade Ativa em 2004, e Curso de Extensão em Preparação Psicológica e Física para a Gestação, Parto, Puerpério e Aleitamento pela UNICAMP em 2006, onde neste mesmo ano, participei da palestra "Dando à luz em liberdade - Parto e Nascimento como Evento Familiar" com a parteira mexicana Naolí Vinaver Lopez. O que é uma doula? Uma mulher experiente que serve (ajuda)outra mulher durante o trabalho de parto e o pós-parto. Fui doula por 18 anos. Sigo agora como psicóloga atendendo em consultório particular na Vila Prado em São Carlos-SP Contato: vaniacrbezerra@yahoo.com.br (16) 99794-3566

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Larissa, Maycon e Yasmim 28/02/2010

Larissa me conheceu nas reuniões do GAPN São Carlos. Entrou em contato por e-mail dizendo que viajaria aos EUA no final do ano, e queria deixar tudo combinado para quando voltasse de lá, assim começaríamos as reuniões de preparação para o TP. Mas janeiro foi passando, foi passando... tinha quase acabado quando ela ligou. Estivera muito doente. precisamente no meio da viagem aos EUA! Antecipou um pouco a volta e usou blusas de manga comprida para esconder as manchas que apareciam pelo corpo.


Antes da viagem ela já tinha contraído a gripe A. Ficou internada, tomou remédios fortíssimos e melhorou, como a maioria das pessoas que pegaram a gripe e estavam sendo acompanhadas por bons médicos, graçasaDeus! E então, após a gripe, uma doença que se manisfestou na pele... e após alguns dias de investigação veio o diagnóstico: pênfigo gravídico. Uma doença autoimune, que causa muito incômodo, e estando grávida, Larissa não podia tomar a dose máxima de medicamentos. Além disso havia um certo risco de que a doença atingisse a criança.

Quando fui à casa dela pela primeira vez, dia 04/02/10, ela me contou quer estivera internada em outra cidade para o tratamento da doença, e lá os médicos haviam recomendado que ela fizesse a cesárea com 32 semanas, no máximo 34. Mas ela, o marido e a médica haviam concordado em esperar um pouco mais, passando por exames mais frequentes para se certificarem do bem estar da bebê. A cesárea seria feita se fosse necessária.

Larissa sofria de intenso desconforto. Muita coceira durante a noite quase a impediam completamente de dormir. Conseguia cochilar entre um banho e outro. Tomava vários banhos frios durante a noite pois a água aliviava a coceira sem piorar o quadro. Quando ela não resistia e se coçava, novas lesões apareciam... e a doença parecia ser cíclica. Ela às vezes melhorava por vários dias seguidos, a pele começava a clarear... então vinha uma nova leva de bolhas e manchas, a coceira piorava de novo... e no meio disso tudo Larissa permanecia muito calma, e também muito calada. Parecia em eterno estado de meditação, aguentando a doença, a tensão não só pela sua saúde como pela da bebê, a pressão dos médicos do hospital especializado para que fizesse a cesárea.

Pesquisei a doença, e posso dizer sem sombra de dúvidas: nunca rezei tanto por uma doulanda minha. Já tinha rezado por outras doulandas antes: pedindo que o bebê que estava sentado se virasse, pedindo que a moça entrasse em TP antes de 41 semanas pq a família não aguentaria esperar mais... mas esse caso era completamente diferente. Rezei, rezei, rezei, e também coloquei meio mundo para rezar junto comigo.

Fiz uma coisa que não fazia há muito muito tempo, quando eu ainda trabalhava como psicóloga hospitalar na ala de grandes queimados, e depois quando trabalhei no ambulatório de dermatologia antendendo casos de alopécia e de psoríase: o trabalho com imagens. Uma coisa parecida com meditação dirigida, usando a imagem de "cura egípcia". Basicamente envolve o relaxamento e o uso da imaginação com o máximo de detalhamento possível da pele sendo limpa, todas as crostas sendo retiradas, um bálsamo curativo sendo aplicado e uma pele nova e saudável surgindo no lugar. Todas as emoções que surgirem durante o trabalho com imagens devem ser trabalhadas, preferencialmente em terapia. Larissa disse que experimentou certo alívio, mas como eu já disse antes, ela é impressionantemente calada, de modo que é muito difícil saber se ajudou meeeeeesmo. Enfim, eu não poderia deixar de tentar.

Numa quinta-feira à noite, dia 25/02, fizemos, eu e Katrina, uma oficina de parto. Tivemos cinco casais presentes, um dos quais formado por Larissa e Maycon. Lembro que no início eu pedi que os casais se apresentassem, incluindo o nome do bebê e de quantas semanas estavam. Eu doularia 4 desses casais, e 3 deles já estavam beirando as 38 semanas. Ficaram preocupados com a possibilidade de coincidência nos TPs, e nos encontros seguintes todos me perguntaram o que eu faria neste caso. O que ninguém sabia era que além desses 3, a indução do parto da Larissa já estava marcada para o mesmo período. O que ninguém sabia é que tinha mais uma gestante que eu doularia, e que não pode ir à oficina pq o pai dela estava internado em SP. E todos esses 5 bebês nasceram num intervalo de 20 dias, e eu pude doular todos.

Então, voltando... Larissa era minha doulanda com o menor tempo de gestação, mas sua indução foi marcada para a data em que completaria 37 semanas. Com o avanço da gestação era preciso aumentar as doses do remédios, o que implicava também em risco aumentado para a bebê... então Larissa, Maycon e Dra Carla decidiram que já haviam esperado o máximo possível dentro de uma limite razoável de segurança. A oficina foi na quinta, e a indução estava marcada para começar no sábado.

Como sempre, nos casos de indução, combinei que ela me chamaria quando as contrações estivessem começando a ficar frequentes, com intervalos regulares de 5 em 5 minutos. E isso aconteceu no domingo de manhã. Às 8h30 ela me ligou dizendo que a bolsa havia rompido, as contrações estavam ficando mais fortes e os intervalos já estavam um pouco menores que cinco minutos. Então terminei de tomar o café da manhã, peguei meus "apetrechos doulísticos" e fui para a maternidade. Meu marido me levou.

Entrei sem problemas, e os encontrei no quarto grande, onde ficam na maioria das vezes as moças que desejam o parto natural. O banheiro é um tanto maior que nos outros quartos, o que facilita a montagem da banheira inflável. Encontrei o quarto todo preparado, a banheira já montada, a bola de fisioterapia novíssima, recém adquirida pela maternidade do convênio prontinha para ser usada. Nossa! Quanta diferença da primeira vez que doulei nesta maternidade! Graças a Deus! E graças às enfermeiras que participam deste movimento de humanização do parto e nascimento em São Carlos. Um viva às enfermeiras!

Larissa, tranquila como sempre, contou como tinha sido a noite, e estava feliz porque as coisas estavam indo bem.

Fui até a cozinha pedir água quente para colocar na bolsa, já que o TP ainda iria longe e ainda era cedo para lançar mão da banheira. À principio me responderam que não tinham esse hábito (de ficar esquentando água para os pacientes)... imagina se todo mundo resolve ir na cozinha pedir água quente! No dia achei isso meio estranho... rsrsrs... a maioria das pessoas nem faz idéia do quanto uma bolsa de água quente pode ajudar uma mulher em TP... quase um ano depois acho que elas tem uma certa razão. Então, nesse dia, a enfermeira plantonista deu um jeito de arrumar água quente prá mim, e nas próximas doulagens acrescentei aos meus apretechos um aparelho elétrico para poder esquentar água no quarto.

Aí... quando a água quente chegou, coloquei na bolsa de água quente e ela estava furada! Cacetada... parece que teremos que nos virar sem isso certo? Errado! Liguei para a Dra Carla e perguntei se ela poderia passar numa farmácia e comprar outra bolsa de água quente prá mim. R) "Claro, sem problemas"! Moral da história: eu sou uma doula muito sortuda! Quantas doulas deste páis podem ligar para a médica obstetra e pedir um favor desses? Aposto que dá para contar nos dedos!

Bom... tudo isso aconteceu em cerca de duas ou 3 horas. E nesse meio tempo as contrações tinham se aproximado mais, chegando a regular o intervalo de 3 em 3 minutos, quando pode-se dizer que começou a fase ativa do trabalho de parto. Havia uma recomendação de trocar o soro quando isso acontecesse, mudando para uma concentração maior e um pouco mais frequente. Até hoje não entendi bem o que aconteceu, mas alguma coisa saiu errada nessa troca, e as contrações ficaram de repente próximas demais e muito intensas. Coloquei a banheira para encher o mais rápido que pude, e fazia massagens nas costas usando um óleo próprio. Incrivelmente nas costas, na região da lombar não tinha nenhuma lesão na pele dela, de modo que eu podia fazer a massagem sem nenhum receio de piorar o quadro da doença. Assim que a banheira ficou meio cheia ela entrou e continuamos jogando água nas costas e apoiando em tudo que podíamos: eu, a mãe dela - Dona Cláudia, e o marido Maycon.

Dra Carla chegou nessa hora, pouco antes do almoço. A proximidade e intensidade das contrações nos levaram a crer que o nascimento era eminente, e para se certificar a Dra Carla fez um toque, e estava com 6 cm se não me engano. Portanto havia ainda um caminho a percorrer. Então Dra Carla percebeu o erro na frequencia do gotejamento do soro, e pediu que ele fosse retirado e que passassem um soro rápido, puro, pra diluir a concentração da ocitocina sintética que havia sido excessiva. Isso gerou uma consternação na equipe e na família, eu mesma me lembro bem de ter me sentido meio perdida nessa hora. Parecia que não tinha mais nada de errado para acontecer. Mas Larissa não se abalou. Permaneceu calma, vocalizava forte durante as contrações, relaxava nos intervalos, mesmo que fossem pequenos, e aos poucos realmente as contrações ficaram menos intensas e frequentes, voltando à normalidade. Perto das duas e meia da tarde a dilatação se completou, e nesse ponto ela estava já sem o soro, pois elas se mantiveram frequentes mesmo sem ele.

Bem calmamente ela foi transferida para o centro obstétrico. A transferência nesse caso era necessária por não ser uma gestação de baixo risco. Então fomos todos para lá, Larissa sentou-se na banqueta de parto, Maycon ajeitou-se sentado na banqueta que geralmente é utilizada pelo obstetra que acompanha partos feitos da forma tradicional, e a obstetra sentou-se no chão, em frente à Larissa.


imagem ruim por conta da penumbra
A pediatra chegou, e estando o quadro completo passamos a aguardar calmamente a chegada da Yasmim. As contrações vinham, Larissa vocalizava forte, a contração passava. Vinha outra, outra vocalização, e passava. E assim ficamos uma hora.


Foi a primeira vez que levei o celular para dentro do C.O. com uma música colocada no MP3 especialmente para as doulagens. A mesma música que gosto de tocar nas oficinas de parto. Uma música loooonga, com uma mudança forte de ritmo no meio. Uma música que começa bem calma e vai ficando mais intensa, mais intensa... e é tão longa que às vezes a gente pensa: essa música não termina?

Toquei a música 3 vezes.

Uma hora o Maycon olhou prá mim e disse: "não tem alguma toalhinha pra dar prá ela morder"? Quase ri na hora de responder, falei que isso não se usa mais... e ele respondeu: "mas ela tá me mordendo"!

Eita!

Rapidinho pedi prá enfermeira e ela arrumou uma compressa que ficou na mão dele. E ela mordia prá valer. Gritava durante as contrações, jogava o corpo prá frente e aí mordia o que encontrasse ao alcance da boca. Estava perdendo o controle, começou a querer chorar nos intervalos, pensando em desistir. E nessa hora... nunca contei prá ninguém, mas eu não só não consegui ajudar como fiquei morta de medo de atrapalhar. Eu comecei a sentir uma dor horrível que coincidia com as contrações, era uma dor no olho direito que irradiava como uma dor de cabeça, eu sentia como se uma faca estivesse entrando no meu olho e meu estomago embrulhava, eu sentia tonturas. Saí de perto dela várias vezes bem no meio da contração, pq eu tinha medo de vomitar e de desmaiar!

Eu saia de perto, respirava fundo, e melhorava. Aproveitei para tirar fotos.

Era domingo à tarde e o centro obstétrico estava quase vazio, bem diferente da agitação dos dias de semana... mas isso tb fazia que as vocalizações da Larissa chamassem a atenção de todo mundo que estava lá dentro sem ter muito o que fazer... então teve uma hora que se formou uma pequena platéia diante da porta que estava aberta. O que fez a Dra Patricia levantar-se e fechar à porta. Excelente providência.

E vinha outra contração, lá vinha a minha dor de novo, e náuseas. Pensei seriamente em pedir licença e sair para não causar transtornos. E em nessa hora a Dra Carla começou a dizer aquelas palavras esperadas: "ótimo, ótimo, ótimo, continue assim que vai nascer, não desista agora, tenha coragem, vai nascer"...

E nasceu às 4 da tarde do domingo. Yasmim nasceu em excelentes condições.




Larissa teve uma hemorragia um pouco aumentada, provavelmente devido à indução, mas só precisou se deitar bem depois que a Yasmim já tinha sido bastante abraçada, olhada, "paquerada" e estimulada a mamar.

Quando já estava tudo bem eu sai do centro obstétrico, fui comer alguma coisa e tomei um remédio para a dor de cabeça. Melhorei rápido, afinal a dor aguda nos olhos pareciam vir junto com a contrações... acho que nunca vou entender isso!

Uma concessão especial para o caso de Larissa, pelo risco maior de infecção por causa das lesões da pele, Larissa ficou em um apartamento, apesar do plano dela ser coletivo. Uma prevenção, que se converteu também em conforto, muito merecido no caso dela, que tinha ficado tantas noites mal dormidas.

Então... depois de uma gestação nada tranquila, um parto induzido que acabou bem, a amamentação. E mais uma luta a ser vencida, e Larissa não se fez de rogada, e foi atrás de resolver uma por uma das dificuldades. Tirava leite e servia no copinho, mantendo a amamentação exclusiva, ainda que a Yasmim não estivesse propriamente mamando... e um dia seus esforços foram recompesados. Até chorei no dia em que abri um e-mail e Larissa me contou que Yasmim estava mamando no peito há algumas semanas, com quase 4 meses. Que benção! Que determinação!

Por falar em determinação, vejam neste link o relato da Dra Carla:

http://parirenatural.blogspot.com/2010/04/forca-feminina-pode-superar.html#comments

Larissa, doular vc foi sem dúvida uma das maiores emoções na minha vida de doula. Nunca vou saber o que me levou a sentir dor junto com vc, mas seja lá o que for, valeu a pena. Foi uma linda tarde de domingo.

Maycon, parabéns pela força que você revelou nos momentos finais do parto, ajudando Larissa a trazer a Yasmim para o lado de cá da barriga.

Yasmim, PARABÉNS pela mãe que tem, e pela linda família que vc veio integrar.

Um grande beijo a todos.

Vânia Doula.

______________________

Oi Vânia. Como vc está???


Que saudades........ que saudades de gravidez, dos nossos encontros e encontros com a Carla..... foi muito bom relembrar...... pois qdo penso na gravidez consigo pensar nas coisas boas e de como estamos felizes e ainda mais completos com a nossa pequena Yasmin.... e já se passaram 11 meses exatamente hoje. E cada dia vemos como td valeu a pena!!!

Muito lindo o relato!!!! Gostei muito de ler e relembrar..... e agradeço muito a Deus ter pessoas como vc, a Carla e o Maykon me acompanhando e dando força durante a gravidez e o parto!!!! Pois se não tivesse vcs e falassem muito que teria que fazer uma cesária com 32 ou 34 semanas, sem ter um apoio extra, é bem provavel que teria feito e talvez sofrido muito mais com a possibilidade da Yasmin ter que ficar mais tempo no hospital.

Vânia, qdo voltei para o quarto depois da Yasmin nascer percebi que vc não estava bem, mas pensei que fosse somente cansaço, pois foi um tp intenso e demorado, nem imaginei que tivesse sentido algo parecido.... e com certeza nunca vamos saber porque disso.

Mas uma coisa eu sei..... que eu não desisti, pois tive muito apoio, e isso foi fundamental, pois qdo vi que tinham errado na indução pensei muito se não era a hora de desistir ..... já tinha dado muita coisa errada ..... será q não era um sinal..... será q não estava sofrendo tanto à toa... Mas mesmo com td isso sou muito a favor ao parto natural e depois de passar por td aquilo.... se pudesse voltar a trás com certeza não faria uma desne-cesária.

Obrigada pelo apoio!!!!

E se da próxima vez vc estiver por aqui..... vou tentar falar um pouco mais....rsrsrs.

E sobre a meditação .... eu sou um pouco indisciplinada e pensava nela a noite e acredito que tenha ajudado sim, mas pensava antes de dormir não na mesma ordem e nem sempre em tudo q estava escrito, mas sei que nas duas ultimas semanas de gravidez minha pele estava bem melhor, com bem menos manchas.

E agradeço muito a todos que rezaram por nós, pois as orações tb nos deram muita força na hora P.

Bjs e td de bom!!!!

Larissa

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Roberta, João e Rachel - 02/09/2010

Roberta foi a algumas reuniões do GAPN São Carlos. Tinha duas cesáreas anteriores, e entendíamos ambas como "desnecesáreas". Agora ela queria ao menos entrar em trabalho de parto.

Fizemos a preparação como de prache, e sempre conversávamos bastante sobre o espanto que ela causava na maioria das pessoas: como assim, vc já tem duas cesáreas e agora quer ter parto normal????

Pois é... evidências científicas!

E tudo corria bem, até que um imprevisto trouxe novas variáveis à situação: o filho mais novo, Samuel, teve apendicite e passou por uma cirurgía. Fui visitá-lo na pediatria e lá estava Roberta, descansando em uma poltrona reclinável que as enfermeiras tinham arrumado para ela. Ela estava tendo contrações indolores bastante regulares, e achei impressionante como a barriga entortava para o lado direito... até tirei uma foto, mas o vestido era de listras e a imagem ficava distorcida.

Bom... tudo correu bem com o Samuel, ele teve alta, voltaram todos para casa, incluindo a mãe da Roberta, para cuidar do Samuel, ajudá-lo, por exemplo, a sair da cama e descer as escadas, coisas que a Roberta não poderia fazer com facilidade estando com um barrigão de 9 meses.

Roberta tinha muitas contrações durante a noite que desapareciam quando amanhecia o dia. Passou algumas noites muito mal dormidas por conta disso, e sendo janeiro, filhos de férias em casa, uma construção em fase final no terreno ao lado do quarto... também não conseguia dormir bem durante o dia, no máximo tirava uns cochilos.

Então, no dia 09/02/2010 às duas da manhã o João me ligou dizendo que a bolsa tinha rompido e Roberta estva com contrações a cada 5/7 minutos. Conversamos, estava tudo bem, pedi que me ligassem então quando estivessem um pouco mais próximas. 2h30 ele ligou. Os intervalos já estavam menores que 5 minutos. Excelente! Mas ela pediu para me dizer que não estava se sentindo à vontade em casa porque não poderia andar pelos corredores nem ficar muito tempo no chuveiro porque sua mãe acordaria, ficaria nervosa, então ela queria ir para a maternidade. Tudo bem... levantei, tomei um bano rápido, peguei minhas coisas, chamei um táxi... e cheguei na maternidade antes deles.

Quando eles chegaram a Roberta praticamente tinha perdido o controle sobre a dor. As contrações estavam mesmo bem próximas. Dra Carla foi chamada, e enquanto isso Roberta foi para o chuveiro, João e eu apoiando, dizendo palavras de incentivo, e passávamos um gel calmante nas costas dela, pois era onde ela referia mais dor. João tirou os sapatos, arregaçou as mangas, e durante as contrações ele praticamente entrava debaixo do chuveiro para fazer-lhe massagens nas costas, ela soltava a garganta e fazia aquele famoso mantra:

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII

E assim passava mais uma contração, tudo indo muito bem.

Dra Carla chegou, conversou um pouco, apagou  a luz do banheiro para ficarmos na penumbra... (eu quase sempre esqueço deste detalhe! :P ), fez o toque depois de algum tempo, e constatou 3 cm de dilatação. Até aí tudo indo muito bem, batimentos cardiacos fetais excelentes... Dra Carla então foi dormir no quarto ao lado. (Não voltou para casa por uma precaução, por se tratar de VBA2C, pois normalmente até a parturiente seria orientada a voltar para casa... mas nesse caso ela tinha vindo mais cedo por conta própria, então o que podíamos fazer era apoiá-la e aguardar a evolução natural).

Dia quase amanhecendo, Roberta referindo cansaço intenso e muita dor, pediu cesárea. Lembro exatamente das palavras dela:

- "Eu sei a dor que estou sentindo e sei a dor da cesárea. O que eu quero agora é descansar, eu quero poder dormir. Depois eu lido com a dor da cirurgia".

Então assim foi. Cesárea a pedido, feita com muito respeito, pai presente e tirando fotos, todos muito felizes. Rachel nasceu às 5h50, com 4,050Kg e 48 cm.


Rachel nasceu no dia em que quis, pode sentir que algo diferente estava acontecendo, sem nascer com dia e hora marcada, e pessoalmente fico muito feliz quando isso acontece.

Enquanto aguardávamos que Roberta saísse do centro cirúrgico o pastor chegou. Juntos, João, o pastor e eu, juntamos nossas cabeças e rezamos pela Rachel.

Aguardei que Roberta chegasse no quarto e estivesse instalada antes de ir embora, muito feliz por ter testemunhado mais um nascimento com respeito.

Roberta, João e Rachel, muito obrigada por terem me convidado para essa festa. Linda festa, com certeza. Beijos a toda família.

Ah! Tempos depois a EPTV me ligou perguntando se eu me utilizav da música durante a preparação para o parto, formação de vinculo mãe/bebê, etc... respondi que sim, e eles pediram uma entrevista junto com alguém que tivesse feito isso. Na hora me lembrei da Roberta e sua família, e eles prontamente aceitaram colaborar com a reportagem. Foi uma linda apresentação, todos juntos cantando "Eu sei que vou te amar" para a Rachel. Pena que a EPTV não permite que suas reportagens sejam disponibilizadas no youtube, e no site deles só permanece por pouco tempo, então não podemos revê-la.


Vejam as palavas da Roberta ao ler o meu relato:

"GOSTEI MUITO DO RELATO SIM, PODE PUBLICAR, SÓ GOSTARIA QUE VOCÊ ACRESCENTASSE QUE EU TIVE MUITO MEDO NA RETA FINAL PORQUE A RACHEL HAVIA SUBIDO E MUDADO DE POSIÇÃO UM DIA ANTES, DAÍ EU FUI FAZER UM ULTRASSOM E A MÉDICA ME DISSE QUE ELA TERIA MAIS DE 4 KG E ISSO ME DEIXOU APAVORADA, SEM CONTAR QUE REALMENTE ELA HAVIA SUBIDO E SAIDO DA POSIÇÃO. MAS FIQUEI FELIZ POR TER ME ESFORÇADO POR ELA E TER DEIXADO QUE ELA ESCOLHECESSE O DIA DE NASCER.


FOI MUITO ROMANTICO PARA MIM TER MEU MARIDO AO MEU LADO DE ROUPA E TUDO NO CHUVEIRO... PASSANDO TODOS AQUELES MOMENTOS MARCANTES EM NOSSAS VIDAS...

E VOCÊ FOI UMA DAS PESSOAS QUE NOS AJUDOU A PASSAR POR TUDO ISSO, MUITO OBRIGADA!

TAMBÉM ACRESCENTE QUE A RACHEL OUVIU MUITA MÚSICA NO MEU VENTRE E EU CANTEI MUITO PRA ELA. E HOJE ELA É UM BEBÊ QUE ADORA MÚSICA...

MANDE NOTÍCIAS...

Que Deus te abençõe!

Um abraço: Roberta Rodrigues!"




Como sempre: foi uma honra!

domingo, 2 de janeiro de 2011

Ana Patricia e Emanuelle - 04/01/2010


Ana Patricia me encontrou durante as reuniões do GAPN. Foi a poucas reuniões, pois sendo diretora de pré-escola e estando já com a gestação avançada, sentia muito sono durante as reuniões que começam já às 19h30. Mas me lembro bem dela no dia em que passamos o filme "business of being born". Ela saiu antes do termino do filme, mas em uma das reuniões na casa dela assistimos o que tinha faltado. Durante a preparação para o parto a Frê participou de uma ou duas reuniões, mas foi bem nessa época que eu e Frê decidimos que não não doularíamos mais juntas, e sim ficaríamos de backup uma para a outra. Isso tinha funcionado bem nos partos da Michele, da Danuza e da Claudia. Assim decidimos que levaríamos adiante este esquema.

Na última vez em que fui à casa da Ana Patrícia para a preparação para a amamentação e primeiros cuidados com o recém-nascido, ela me deu uma cópia da chave do apartamento. Eu sempre dizia para me chamar quando as contrações estivessem começando a ficar próximas, e que quase sempre eu recomendava um banho morno e demorado enquanto eu não chegasse. Por morar sozinha ela me disse que tinha receio de não escutar a campainha, e mesmo que escutasse teria que sair correndo, enfim... me deu a cópia da chave, assim mesmo de madrugada eu entraria sem problemas e ela poderia realmente relaxar no banho, sem ficar preocupada em escutar a campainha.

Alguns dias depois percebi que tinha perdido a chave! Mas que meleca! Fiquei me imaginando chegando de madrugada e tocando a campainha... já ia começar tudo errado! Pensei, pensei, rezei, fiz um pouco de auto-hipnose... dormi. Algumas horas depois acordei e pensei: a chave ficou no banco. Ao passar por uma porta giratória eu tirei todas as chaves que estavam na minha bolsa, e na hora de pegar do outro lado não reconheci a chave que não era minha. Liguei no banco, o gerente confirmou que a chave estava lá. Fui lá buscar e passei por 3 ou 4 pessoas me chamando de Patrícia, pois o nome dela estava escrito no chaveiro... nem me passou pela cabeça dizer que a chave nem era minha! Haaaaaaaahahahaha

Então, entre o Natal e o Ano Novo ela me ligou para avisar que se não entrasse em TP até o dia 04/01 iria se internar para uma indução. Patrícia tinha uma perda gestacional anterior e o fantasma da perda começou a incomodar muito, mais a família pressionando... então ela decidiu que não queria esperar mais que 40 semanas. Conversamos um pouco, mas enfim, aceitei. Cada uma sabe onde lhe aperta o sapato, e não seria eu a abandoná-la nessa hora. Seria uma indução sem pressa, colocando os comprimidos para preparar o colo, e o soro só depois que a indução se mostrasse com alguma chance de dar certo. Isso é que os médicos com quem eu estava acostumada a trabalhar faziam nos casos de indução.

E assim, chegou o dia da indução. Ela se internou bem cedo, junto com a mãe, e eu combinei que dormiria até um pouco mais tarde e depois trocaria de lugar com a mãe dela, pois o dia prometia ser longo. Normalmente eu nem teria ido antes da indução ter "pegado" ou seja, o soro já fazendo efeito e as contrações já ficando próximas. Mas a história pessoal dela me levava a crer que eu não fosse me sentiria culpada depois, por não ter dado todo o apoio que ela queria. E o que ela queria é que eu fosse logo pela manhã. E assim eu o fiz. Apesar de não ser horário de troca de acompanhantes a enfermagem não colocou nenhum empecilho, e entrei sem dificuldades.

No mesmo quarto que ela, do SUS, tinha mais duas mulheres, ambas em trabalho de parto. Uma sem acompanhante, e outra com uma acompanhante que nem se mexia na cadeira quando vinham as contrações. Patrícia estava ainda sem contrações, então conversamos bastante, e um pouco depois eu me aproximei daquela que estava com as contrações mais próximas e doloridas e estendi a mão, que ela agarrou prontamente, e tb tentei ensinar a acompanhante dela a fazer-lhe massagens nas costas durante as contrações, mas não adiantou. Aquela acompanhante tinha no olhar o terror diante de um desastre natural: para pessoas que não estão preparadas, o parto pode se parecer com um vulcão em erupção ou um tornado vindo na sua direção. O olhar dela parecia dizer: eu queria estar em qualquer outro lugar, menos aqui.

Então, ajudei como pude, mas depois disso a moça começou a me chamar quando vinham as contrações, então eu fiquei numa situação muito desconfortável, pois estava sendo paga pela Patrícia para fazer companhia a ela, e na pratica eu estava doulando a outra mulher, e tudo de graça... comecei a achar que tinha feito uma grande besteira em tentar ajudar a outra moça, mas me conhecendo bem eu sei que jamais conseguirei estar com alguém em TP e não fazer nada para incentivá-la. Mesmo que fosse hoje, eu não conseguiria agir de forma diferente...

Bom: chegou o almoço, Ana Patrícia olhou para mim e me disse que eu podia ir almoçar em casa já que ela mesma iria almoçar e dormir um pouco, não havia necessidade de ficar lá lhe velando o sono... aceitei, agradecendo aos céus a solução do meu dilema, e ainda falei palavras de incentivo para a outra moça antes de sair.

Voltei às duas da tarde, e logo depois a enfermeira fez um exame de toque, falou que o colo do útero estava sem alterações e colocou o segundo comprimido. Uma hora depois foi servido chá com bolachas, e ela estava comendo quando o obstetra plantonista passou e falou para ela que ela estava de jejum. Foi até uma cena engraçada pq ela estava com a boca cheia e ficou olhando para ele sem mastigar... aí ele completou: "pode terminar de comer mas depois disso vc está de jejum". Então ela acenou com a cabeça e ele saiu.

Ela olhou para mim com cara de interrogação, e eu expliquei que jejum só pode significar cesárea. Conversamos sobre aceitar ou não aceitar, solicitar alta a pedido... quais seriam os desdobramentos se ele indicasse cesárea? Ela não queria voltar para casa sem seu bebê nos braços, e estava bem tranquila.

No finalzinho da tarde eu sai do quarto para ir ao banheiro. E quando estava voltando o médico estava entrando no quarto dela. Eu acelerei o passo para entrar junto, mas ele apontou para mim, sem me olhar, e disse: "vc fica"! E fechou a porta. Fiquei rindo, me sentindo meio cachorro, imaginando se quando ele saísse do quarto, diria "junto"!

Depois que ele saiu ela me contou que as palavras dele foram:

- "Eu estou decidido a te fazer uma cesárea, e só estou vindo conversar com vc pq é paciente da Dra Carla. Se eu não fizer a cesárea hoje o plantonista de amanhã fará".

Então ela aceitou a cesárea por "falta de dilatação", mas que fiquei bem claro que ela não entrou em trabalho de parto, e essa cesárea não era necessária naquele momento, nem de longe!

Pude entrar sem problemas no centro obstétrico, e fiquei na janelinha. Filmei e tirei fotos.



Quando sai para esperar que ela fosse para o quarto estavam lá fora a mãe dela e o pastor da igreja. Rezamos juntos pela nova vida que estava tendo início do lado de cá da barriga. Muita saúde e paz foram nossos desejos.

Então ela saiu, e perguntou se eu não poderia passar a noite com ela. Bom.. um parto sempre pode demorar 24 horas, então achei que sim, sem problemas! (Levando em conta que eu não doularia mais ninguém naquele mês, então não havia risco de emendar com outra doulagem).

Ela ficou no quarto que tem 4 camas, na cama do canto da parede à direita da porta. É a cama mais longe do banheiro, o que tem implicações tanto positivas quando negativas...

Depois da cesárea, ela já no quarto, e nada da bebê vir, nada da bebê vir... fui lá perguntar, depois alguém da enfermagem veio ao quarto e a Patrícia perguntou... e a resposta: "segundo o ministério da saúde o bebê tem reservas de até 8 horas, portanto é esse o prazo que temos para trazer o bebê para o quarto".

Meu Deus do Céu, nem em mil palavras eu conseguiria expressar a indignação que senti naquela hora. Para mim foi a mesma coisa que escutar: daremos o pior atendimento possível antes de colocar a vida do bebê em risco. Cheguei a responder mansamente:

- Mas se ficamos a gestação inteira escutando que o bebê nunca deve ficar mais de quatro sem mamar, que devemos acordá-lo se ele dormir mais de 4 horas?!

E ela respondeu maquinalmente:- "segundo o ministério da saúde podemos demorar até 8 horas".

O que fazer nessa hora?! Ligar para o Ministério da Saúde e dar queixa de que estão fazendo besteiras em nome deles? Não dá né?

Então às 10h30 da noite, Patricia lamentou ter que fazer isso, mas ligou para a Dra Carla e pediu socorro: já fazia mais de 5 horas que a bebê tinha nascido e nada de vir para o quarto. Cinco minutos depois foi alguém da enfermagem lá garantir que ela estava bem, que não estavam escondendo nada, e pediram que eu fosse até o berçário para testemunhar que estava tudo bem, para acalmá-la. Expliquei que não se tratava de achar que estavam escondendo alguma coisa, só que estava demorando muito para a primeira mamada! Mesmo assim fizeram questão de me levar ao berçário e me mostrar a menininha, que segundo elas, estava na fila do banho, por causa das muita cesáreas feitas no final da tarde.

Voltei para o quarto, e mais ou menos uma hora depois a bebê foi trazida ao colo de Ana Patrícia.



Um detalhe que não posso deixar de mencionar: quando o bebê mama na primeira hora de vida a pega é melhor, o bebê está mais alerta, suga com mais eficiência e faz o vínculo com sua mãe de forma mais tranquila. Patrícia teve muitos problemas na amamentação, e não posso deixar de pensar que foram no mínimo piorados pela cesárea sem motivo e pela demora na primeira mamada. Não digo que é certeza que não teriam acontecido, mas o atendimento ruim aumentou a probabilidade desses problemas aparecerem.

Eis um excelente documentário sobre este assunto:



Passei a noite com elas, e curiosamente a única que estava no mesmo quarto e teve parto normal foi a mesma moça que eu tinha ajudado durante a manhã. E ela infelizmente estava sem acompanhante, e parecia ter raiva da bebezinha dela, como se o choro da bebê fosse proposital sabe? ("Queeeem se atreeeeeve a perturbaaaar o meu soooooono?"). E esse sentimento parecia ter eco na menininha, que chorava muito, e se aquietava assim que qualquer outra pessoa a pegava no colo. Uma situação muito triste de se ver, que mobilizou todas as acompanhantes que estavam no mesmo quarto, de modo que acabamos nos revezando para fazer aquela menininha dormir, assim todas as outras moças tb poderiam descansar.

Me lembro da Ana Patricia também comovida, dizendo assim: "Vânia, ela nem olha pra filha dela"! Pois é... era chocante de se ver.

Bom... passei a noite lá, ajudei em tudo que pude, e até tirei um cochilo no banco/sofá. Não foi tão ruim. Pela manhã a mãe dela foi para lá e eu fui para casa.

Alguns dias depois visitei-as em casa, em Patricia estava às voltas com problemas na amamentação, sentindo muita dor. Levei bananas para as cascas serem utilizadas como cicatrizantes, e tentei apoiar no que estava ao meu alcance. Mais alguns dias recebi uma mensagem dela dizendo que já tinha voltado a amamentar, e estava tudo correndo muito bem. Estavam felizes.

Assim foi a primeira doulagem de 2010. Lances problemáticos, um médico nada humanizado, que se deu ao grande trabalho de trocar algumas palavras sua paciente, mas deixando claro que isso era uma concessão especial por ela não ter feito o pré-natal pelo SUS.

Quanto a mim, fico grata pelo anestesista daquele dia ter me deixado entrar para filmar e tirar fotos pela janelinha, como era o desejo dela. (Mesmo isso sendo um direito garantido por lei federal, e agora também uma lei municipal, há um ano atrás os episódios de descumprimento da lei eram muito comuns). Essa é a única lembrança tranquila que tenho.

De resto, dou graças a Deus pela capacidade que a maioria de nós tem de passar por apuros como estes e sairmos vivos do outro lado, e superamos e continuamos a seguir felizes apesar de tudo. (Sem dúvida seríamos ainda mais felizes se não tivéssemos que superar traumas de nascimento que são impostos pelas rotinas dos atendimentos feitos da forma tradicional).



Ana Patrícia, muito muito obrigada por ter me chamado para estar com você neste dia, em que sua filha veio finalmente lhe fazer companhia.



Emanuelle, parabéns pela mãe linda e batalhadora que você tem. Tenho certeza que nela você encontrará sempre uma grande amiga, de coração e alma.



Um graaaande abraço,

Vânia.
doula, doula, doula a quer doer! rsrrssr