Claro que algumas realmente precisam da cesárea, sem dúvida. Mas em um país onde mais da metade das crianças nascem por cesárea também não restam duvidas de que a maioria foi desnecessária, ou "desne-cesárea" como costumamos chamá-las.
Muito tempo se passou, eu fui embora de São Carlos, e depois voltei... e Renata engravidou, e nos encontramos novamente nas reuniões do GAPN. Pelo face vi o status de Renata: "são gêmeos"! (ela já sabia, já sentia, o exame confirmou). E na reunião do GAPN ela perguntou sobre os riscos de parto gemelar. Lembro como se tivesse sido ontem. A médica explicou com detalhes, fazendo gestos com as duas mãos fechadas para mostrar o risco teórico de que se o primeiro gêmeo estivesse pélvico as cabeças poderiam "enroscar" uma na outra, então, desde que o primeiro estivesse cefálico o parto seria possivel.
No grupo tínhamos informação de dois nascimentos gemelares, um acompanhado pela médica e outro acompanhado pelo médico, este com um detalhe interessante: o intervalo entre os nascimentos foi de várias horas, de tal modo que acabaram nascendo em dias diferentes. Com esse relato de atendimento tranquilo Renata mudou de médico, e durante toda a gestação frequentou as reuniões do GAPN, fez hidroginástica e me contratou como doula. Foi a um encontro do grupo Maternas para ver os slings e fraldas de pano modernas, e também foi a uma oficina de Preparação para a Amamentação e Primeiros Cuidados com o bebê. Durante a gestação Renata ainda fez um Curso de Doula, oferecido pela Prefeitura de São Carlos. Depois disso, nos nossos encontros, perguntei a ela se não gostaria de convidar alguma colega do curso de doulas para acompanhar o parto, numa espécie de estágio de observação. Renata gostou da ideia e chamou a Laura Moratti, que também é mãe de gêmeos. Então fizemos mais uma reunião na casa da Renata e do Silvio, para nos conhecermos (eu e Laura), e nesse dia praticamos algumas posições para facilitar a descida do bebê e algumas técnicas de massagem. Banheira inflável comprada, assim como duas caixas de vit K, totalizando 10 ampolas, para não restar duvida de que seria suficiente.
Assim ficamos prontos, esperando pelo dia em que Francisco e Gustavo decidiriam que já era hora de nascer. Me lembro que uma dia nos encontramos, e Renata falou: "Vânia, eu adoro a cara que vc faz quando olha pra minha barriga!".
Fazer o que né? o barrigão era enorme! Preciso treinar muito mais a minha expressão "poker face", mas a Renata também é psicóloga! rsrsr Mulher, psicóloga e grávida, praticamente um poço de sensibilidade, e eu tentando disfarçar a cara de espanto. Puro tempo perdido!
Num sábado a Renata me avisou que estava em pródromos: contrações espaçadas, intervalos irregulares e não muito doloridas. A noite passou e no domingo a tarde ela me chamou. Neste ponto os intervalos já estavam mais próximos e a intensidade aumentando. Chamei um táxi que sempre parece demorar uma eternidade para chegar... mas quando cheguei à casa dela encontrei o casal muito tranquilo. Acompanhei as contrações durante algum tempo, e resolvemos chamar a Laura, afinal se a intensão era acompanhar a doulagem não seria adequado chamá-la só na hora de ir para a maternidade. Renata continuava muito tranquila, às vezes se sentava para descansar um pouco, mas levantava quando vinham as contrações, às vezes se inclinava para a frente e às vezes ficava de cócoras. Tinha suquinhos e sorvete pra ela saborear durante o trabalho de parto.
já na Casa de Saúde - usando a bola e concentrando-se |
na banheira inflável, com apoio amoroso e concentração. |
na banheira inflável, com apoio amoroso e uma luz linda! |
Ficamos por ali, Renata super tranquila, andava, ficava de cócoras, sentava-se um pouco na bola, um pouco no sofá, a enfermeira vinha fazer a ausculta, estava tudo muito bem.
ficando de cócoras durante a contração para facilitar a descida dos bebês. |
Voltei para o quarto e eles ficaram por ali, o pai e a mãe da Renata. Depois foram esperar na sala de espera, eu os via quando saia do quarto para buscar alguma coisa.
Dai a pouco Laura chegou e ficou responsável por tirar algumas fotos e se possível filmar o parto.
Perto do meio-dia o médico veio ver como estavam as coisas, e a essa altura a Renata já estava na banheira, com as contrações mais próximas, e sentindo alivio com a técnica de cabo de guerra. O médico perguntou se podia avaliar antes de sair para almoçar, para não ter que voltar correndo, e Renata concordou. O primeiro bebê já estava bem baixo, quase nascendo! Ele então pediu pra alguém avisar a família que ele não iria almoç
ar em casa, e a enfermagem começou a arrumar as coisas para a recepção dos bebês.
Nessa hora houve um imprevisto: nem o pediatra de preferência nem o back-up estavam disponíveis, então a pediatra que estava de plantão na UTI neo-natal foi chamada e ficou no quarto, até que a pediatra back-up do segundo back-up conseguisse chegar. Falando assim parece até engraçado, mas isso fez uma diferença muito grande no atendimento dos bebês, infelizmente... As duas pediatras ficaram juntas por alguns minutos e fizeram comentários do tipo: "nossa que radical!" e "nossa, quanta coragem!" mas a coragem dita em tom pejorativo. Felizmente falavam em tom baixo, de modo que só quem estava muito próximo podia ouvir.
O médico super tranquilo, sorridente, segurando a mão de Renata durante a contração. O marido de Renata junto dentro da banheira, ambos abraçados e trazendo seus filhos pra esse mundo. Uma cena linda!
Francisco nasceu molinho, a pediatra quis pegá-lo logo, de modo que ficou uns poucos segundos no colo de Renata. Foi aspirado (pq o líquido estava com um pouquinho bem pouquinho de mecônio), ficaram segurando o cateter de oxigênio próximo ao narizinho e ele começou a corar mas permanecia molinho.
Renata teve mais uma contração, colocou a mão e disse que estava com a impressão de que a primeira placenta já ia sair. O médico pediu licença, examinou e disse: é o segundo, já vai nascer. A pediatra e a enfermagem colocaram o Francisco mais para o lado no berço aquecido, pra abrir espaço para o Gustavo.
Enquanto isso veio mais uma contração e Gustavo nasceu empelicado (com a bolsa íntegra). Rompeu logo após o nascimento, então não deu tempo de fotografar, mas todos que estávamos lá vimos como foi lindo o nascimento dele também! Mas ele também estava muito mólinho e com dificuldade de estabelecer a respiração, foi aspirado, e logo chegou a encubadora onde ficariam em um ambiente com mais oxigênio. Eles gemiam um pouco, o que demonstrava que estavam com essa dificuldade de respirar.
Vânia Renata e Laura. |
Fiquei por ali, Laura e Renata conversavam sobre a diferença das experiências. Os gêmeos de Laura também foram para a UTI mas no caso delas ele eram prematuros.
Franscisco e Gustavo tiveram essa dificuldade inicial para respirar, e eu achei que eles ficariam algumas horas no oxigênio e viriam para o quarto. Então fiquei por ali, ajudei a limpar o quarto, almocei, e fui lá ver o Sylvio, que estava na porta da UTI aguardando noticias e com as caixas de vitamina K nas mãos. Conversei com ele e falei que provavelmente quando viessem dar noticias já teriam dado a vit K injetável. Ele só segurava a cabeça entre as mãos, parecendo muito angustiado. É horrível a sensação de impotência nessa hora, de saber que os bebês estão ali do outro lado da porta, e não podemos entrar nem fazer nada a não ser esperar, e os minutos parecem horas...
Voltei para o quarto e dali a algum tempo o Sylvio voltou também. Laura já tinha ido embora. A enfermagem veio trocar a Renata de quarto, iam levá-la para um quarto limpinho. Quando ajudaram ela descer da cama e sentar-se na cadeira de rodas ela ficou muito branca, desmaiou e teve espasmos, como uma convulsão. A enfermagem ficou socorrendo, eu sai pelo corredor à procura da enfermeira, felizmente ela estava perto, voltamos para o quarto, falávamos com a Renata, e alguém jogava água no rosto dela. Ea voltou do desmaio, mas foi ficando branca e desmaiou novamente. Voltamos ela para a cama, a enfermeira pediu pra alguém chamar o médico, mas todas estavam ajudando em alguma coisa, então eu mesma liguei para ele, direto no celular, expliquei e falei que a enfermeira estava pedindo pra ele vir. A impressão que eu tive foi de desligar o celular e ele abrir a porta e entrar no quarto. pois ele já estava vindo enquanto eu ainda estava explicando a situação.
A enfermagem já havia aplicado alguns medicamentos, ele pediu para aumentar as doses, levantar o pés da cama, e pediu para examinar. O útero não havia "encolhido" como era esperado, e por isso estava sangrando muito. Fizeram massagens enquanto aplicavam os medicamentos, e ela foi melhorando. Foi um grande susto, mas passou. Demorou mas passou.
Já era o fim da tarde, Renata e Sylvio muito cansados, resolveram tentar descansar um pouco, afinal tudo o que podia ser feito já havia sido feito, e só restava esperar. Disseram que eu podia ir para casa.
Em casa me deparei com uma situação nova para mim: muita gente comemorando o nascimento dos meninos, e eu tive que dizer que eles estavam na UTI. Fica uma sensação de festa que não deu certo, a música e a dança foram ótimas, mas o bolo não foi servido, não pudemos cantar os parabéns...
Importante salientar: eles não aspiraram mecônio. Dias depois soubemos que o motivo para permanecerem internados que estava escrito no prontuário era "síndrome da membranap hialínica - relativa a prematuridade". ou seja, eu fiquei tranquila pq sendo gravidez de gêmeos e estando de quase 38 semanas eu achei que os bebês tinham iniciado o processo de nascimento, e estariam maduros para respirar. Mas acontece que Renata estava com uma infecção urinária assintomática, sem nenhum desconforto ou ardência, só com a frequência de idas ao banheiro aumentada, o que no final da gestação é esperado... provavelmente foi a infecção que deu início ao TP e os bebês ainda estavam um pouco prematuros. O que leva à seguinte conclusão: se tivesse sido feita uma cesárea eles estariam com os pulmões imaturos também.
Todos os dias recebíamos boas noticias, até que dez ou onze dias depois finalmente tivemos a alegria de saber que estavam em casa. Finalmente! Feliz feliz feliz!
Quando fui visitá-los estavam lindos os dois e Renata estava tentando estabelecer a amamentação.
Agora já vão fazer um ano, estão lindos e muito saudáveis, fazendo a alegria da família toda, ao lado do primo João, que é como o irmãozão deles. Os três mosqueteiros, lindos!
Renata e Sylvio, muito muito obrigada pela honra de acompanhá-los nessa hora tão linda em que seus filhos chegaram! Nem tudo foi como o esperado, mas nada tira o brilho de ver uma família amorosa receber novos membros.
Francisco e Gustavo sejam muito bem vindos! Que esse início um pouco difícil que vocês tiveram se transforme em força e capacidade de superação, sempre sempre sempre! Que vcs tenham muita saúde, muitas felicidades e muitos anos de vida!
No dia em que voltaram ao GAPN para contar como foi o dia do parto. Sou muito grata! |
E João, parabéns pela alegria! Você é uma luz na vida dessa linda família!
beijos, beijos, beijos,
Vânia Bezerra.
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