Quem sou eu

Minha foto
São Carlos (cidade natal), SP, Brazil
Sou formada em Psicologia pela UFU em 1996, fiz Aprimoramento Profissional em Psicologia Hospitalar pela PUC/Camp em 1998, formação de Educadora Perinatal pelo Grupo de Apoio à Maternidade Ativa em 2004, e Curso de Extensão em Preparação Psicológica e Física para a Gestação, Parto, Puerpério e Aleitamento pela UNICAMP em 2006, onde neste mesmo ano, participei da palestra "Dando à luz em liberdade - Parto e Nascimento como Evento Familiar" com a parteira mexicana Naolí Vinaver Lopez. O que é uma doula? Uma mulher experiente que serve (ajuda)outra mulher durante o trabalho de parto e o pós-parto. Fui doula por 18 anos. Sigo agora como psicóloga atendendo em consultório particular na Vila Prado em São Carlos-SP Contato: vaniacrbezerra@yahoo.com.br (16) 99794-3566

terça-feira, 12 de junho de 2012

Sobre a ameaça de processo a quem defende o direito ao parto domiciliar


__________________________________________________________________________________
CARTA ABERTA À SOCIEDADE

Nós, médicos humanistas, enfermeiras-obstetras e obstetrizes, todos os profissionais, entidades civis, movimentos sociais e usuárias envolvidos com a Humanização da Assistência ao Parto e Nascimento no Brasil, vimos através desta presen te Carta manifestar o nosso repúdio à arbitrária decisão do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ) de encaminhar denúncia contra o médico e professor da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) Jorge Kuhn, por ter se pronunciado favoravelmente em relação ao parto domiciliar em recente reportagem divulgada pelo Programa Fantástico, da TV Globo.

Acreditamos estar vivenciando um momento em que nós todos, que atendemos partos dentro de um paradigma centrado na pessoa e com embasamento científico, estamos provocando a reação violenta dos setores mais conservadores da Medicina. Pior: uma parcela da corporação médica está mostrando sua face mais autoritária e violenta, ao atacar um dos direitos mais fundamentais do cidadão: o direito de livre expressão. Nem nos momentos mais sombrios da ditadura militar tivemos exemplos tão claros do cerceamento à liberdade como nesse episódio. Médicos (como no recente caso no Espírito Sant o) podem ir aos jornais bradar abertamente sua escolha pela cesariana, cirurgia da qual nos envergonhamos de ser os campeões mundiais e que comprovadamente produz malefícios para o bin�?mio mãebebê em curto, médio e longo prazo. No entanto, não há nenhuma palavra de censura contra médicos que ESCOLHEM colocar suas pacientes em risco deliberado através de uma grande cirurgia desprovida de justificativas clínicas. Bastou, porém, que um médico de reconhecida qualidade profissional se manifestasse sobre um procedimento que a Medicina Baseada em Evidências COMPROVA ser seguro para que o lado mais sombrio da corporação médica se evidenciasse.

Não é possível admitir o arbítrio e calar-se diante de tamanha ofensa ao direito individual. Não é admissível que uma corporação persiga profissionais por se manifestarem abertamente sobre um procedimento que é realizado no mundo inteiro e com resultados excelentes. A sociedade civil precisa reagir contra os interesses obscuros que motivam tais iniciativas. Calar a boca das mulheres, impedindo que elas escolham o lugar onde terão seus filhos é uma atitude inaceitável e fere os princípios básicos de autonomia.

Neste momento em que o Brasil ultrapassa inaceitáveis 50% de cesarianas, sendo mais de 80% no setor privado, em que a violência institucional leva à agressão de mais de 25% das mulheres durante o parto, em vez de se posicionar veementemente contrários a essas taxas absurdas, conselhos e sociedades continuam fingindo que as ignoram, ou pior, as acobertam e defendem esse modelo violento e autoritário que resulta no chamado "Paradoxo Perinatal Brasileiro". O uso abusivo da tecnologia contrasta com taxas gritantemente elevadas de mortalidade materna e perinatal, isso em um País onde 98% dos partos são hospitalares!

Escolher o local de parto é um DIREITO humano reprodutivo e sexual, defendido pelas grandes democracias do planeta. Agredir os médicos que se posicionam a favor da liberdade de escolha é violar os mais sagrados preceitos do estado de direito e da democracia. Ao invés de atacar e agredir, os conselhos de medicina deveriam estar ao lado dos profissionais que defendem essa liberdade, vez que é função da boa Medicina o estímulo a uma "saúde social", onde a democracia e a liberdade sejam os únicos padrões aceitáveis de bem estar.

Não podemos nos omitir e nos tornar cúmplices dessa situação. É hora de rever conceitos, de reagir contra o cerceamento e a perseguição que vêm sofrendo os profissionais humanistas. Se o CREMERJ insiste em manter essa postura autoritária e persecutória, esperamos que pelo menos o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (CREMESP) possa responder com dignidade, resgatando sua função maior, que é o compromisso com a saúde da população.

Não admitimos, não permitiremos que o nosso colega Jorge Kuhn seja constrangido, ameaçado o u punido. Ao mesmo tempo em que redigimos esta Carta aberta, aproveitamos para encaminhar ao CREMERJ, ao CREMESP e ao Conselho Federal de Medicina (CFM) nossa Petição Pública em prol de um debate cientificamente fundamentado sobre o local do parto. Esse manifesto, assinado por milhares de pessoas, dentre os quais médicos e professores de renome nacional e internacional, deve ser levado ao conhecimento dos senhores Conselheiros e da sociedade. Todos têm o direito de conhecer quais evidências apoiariam as escolhas do parto domiciliar ou as afirmações de que esse é arriscado – se é que as há.

http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=petparto

______________________________________________________________

Taxas de partos x cirurgias cesarianas na cidade de São Paulo: horríveis!





Relato do meu parto

Como não cheguei a entrar em TP naturalmente vou começar contando de onde considero que tenha sido o começo da “novela”.

Eu já estava com 3cm de dilatação, colo do útero “molinho” e a barriga já havia baixado 2cm. Achei que ele nasceria no fim de semana do dia 09 (09/11/2003). Aí na sexta à tarde (dia 08), deu uma chuva de granizo em Guaxupé com pedras pouco menores que bolas de ping-pong. Minha casa ficou alagada porque a calha entupiu rapidamente. Entrava água pelas lâmpadas e pelas tomadas, molhou as camas e os colchões, e até umas roupinhas do neném que eu tinha acabado de passar. Ficou tudo uma sujeira, e a sensação de ninho pronto foi literalmente por água abaixo... ficamos limpando aquela bagunça, e eu ajudando como podia com aquele barrigão imenso.

Liguei pra médica pra avisar que tínhamos decidido ir pra Ribeirão Preto, (agora pela negativa que recebemos ao nosso pedido de autorização para a presença do pai na sala de parto da Maternidade de Guaxupé). Ela estava passando o fim de semana em São Paulo. Liguei à noite, no celular, e ela disse que se eu entrasse mesmo em TP, enquanto eu estivesse na estrada ela estaria também, e que chegaríamos praticamente juntas. Fiquei tranqüila.

No sábado continuamos arrumando a casa, e eu tendo contrações indolores cada vez mais freqüentes e ritmadas. A médica de Guaxupé havia me orientado que se essas contrações ficassem muito ritmadas e cada vez mais próximas eu deveria procurá-la, mesmo sem dor. Eu cheguei a fazer isso porque ficaram de 10 em 10 minutos e depois de 5 em 5 durante mais de 4 horas. Ela me examinou e disse que a dilatação continuava a mesma, só que o colo do útero já estava afinando.

No domingo à noite a médica de Ribeirão me ligou dizendo que já estava em casa e querendo saber como eu estava. Tudo bem... as mesmas contrações indolores já nem tão freqüentes assim. Então ela disse que temia um pouco pela viagem, que gostaria que eu fosse pra algum lugar mais perto, pois havia o risco da bolsa romper. Falou como se temesse que eu ficasse muito nervosa se isso acontecesse. Pedi um tempo pra pensar. Liguei de volta na segunda à noite, falei que eu não tinha medo e que preferia ficar em casa. Aí o argumento mudou: ela disse que o neném estava ficando muito grande, a ultra de 38 semanas estimava o peso em 3,6 Kg, que agora já deveria estar em 3,8 e a cada dia que passava minha chance de um parto normal diminuía. Seria melhor induzirmos o parto o mais rápido possível. Fiquei muda de espanto! Ela ainda disse que eu estava com medo da ocitocina, que não precisava ter medo não... Pedi de novo um tempo pra pensar, desliguei o telefone e chorei até ficar com o rosto inchado e o nariz parecendo um tomate. Mandei uns e-mails, rezei, acendi umas velas... pesei tudo que havia acontecido comigo até ali. Não conseguia acreditar que tinham colocado defeito no Batatinha de novo!

Senti-me completamente impotente.Minha única escolha agora seria ir pra SP, pra casa de algum amigo ou parente, ficar lá esperando o TP começar pra valer, e ir pra uma Casa de Parto. Mas eu não estava nem um pouco a fim de sair da minha casa. Por mais amiga ou conhecida que uma pessoa possa ser eu não ficaria completamente à vontade, e ainda mais com aquele barrigão. Já era difícil dormir em casa, na minha cama, com os meus travesseiros, meus horários, minha televisão, etc. Achei que não funcionaria, que não valia a pena, ainda mais pq o Raul não poderia ir ficar junto comigo. Resolvi encarar a indução como a minha melhor chance de obter algo que se aproximasse, mesmo que vagamente, de um parto humanizado. Numa política de redução de danos conclui que se escapasse da cesárea já seria uma grande coisa.

Na terça de manhã ainda chorei um pouco, mas passei o dia todo arrumando as coisas, tomando chá de canela e pensando na conversa que teria com a médica antes de aceitar a indução. Liguei pra ela e avisei que iria no dia seguinte. Combinamos nos ver no consultório ao meio dia. Ainda tive tempo de correr até o acupunturista (Marcos), que deu um jeito de me atender, trocou minhas agulhas e colocou uma relaxante muscular e uma pré-anestésica.

Na quarta-feira, dia 12, lá fomos nós. Chegando ao consultório ela me examinou, disse que continuava tudo na mesma, exceto por eu ter perdido um pouco de peso e a barriga ter baixado mais 3 cm. A conversa que tive com ela foi a seguinte: “não tenho medo da indução, mas tenho muito medo que isso seja só a primeira de uma sucessão de intervenções: ocitocina, rompe bolsa, dá anestesia e aí fala que fez o possível mas vai ter que ser cesárea.” Ela sorriu... e me respondeu que não poderia me garantir que não acabaria em cesárea porque isso só se vê na hora, mas que bolsa ela não rompe a não ser já com a dilatação completa e SE achar necessário, e anestesista ela não chama mesmo porque a mulher perde a força na hora de empurrar. Completou dizendo que já tinha desmarcado todas as consultas até o final do dia, e que caso eu aceitasse a proposta dela ela estaria comigo o tempo todo no hospital, que me levaria pro chuveiro, que andaria comigo... a opção de ir pra SP ainda martelava na minha cabeça, mas então o pensamento que me veio foi: “eu vou aceitar, e EU vou fazer esta M*... funcionar a qualquer custo”. Aceitei.

Ela fez o papel da internação, ligou pra maternidade, falou que estava enviando uma paciente em TP, com 3 cm de dilatação, e que era pra me por o sorinho com 8 gotas por minuto que ela chegaria em seguida. Como eu não havia almoçado ela disse que se eu quisesse poderia tomar um suco ou uma vitamina antes de ir pra maternidade.

Então saímos em busca de uma lanchonete. Detalhe muito importante: eu não discuti plano de parto com ela, pois tinha resolvido ficar em Guaxupé, então só fiz isso com a médica de lá. Foi quando soubemos que o pai não poderia entrar e decidimos ir pra Ribeirão. Para a médica de Ribeirão pedi apenas que ela tentasse com o pediatra a autorização pro alojamento conjunto que na maternidade em questão ainda não tinha.

RELATO DE PARTO DO BATATINHA – segunda parte

À partir do momento em que saímos do consultório parecia realmente que eu estava em TP. Eu numa serenidade espantosa, e o Raul se confessando ansioso, começou a tagarelar e errava as entradas, dava voltas inúteis no quarteirão.






Depois que eu tomei a vitamina e ele um lanchinho fomos pra maternidade.


Chegando lá, papéis, demora, demora, a atendente me perguntou duas vezes se estava tudo bem, demora, demora, tem que subir de cadeira de rodas, chega, o quarto não está pronto, demora, e finalmente sou levada para o pré parto.


Tira a roupa, fica de avental e touquinha, vem um enfermeira que faz um monte de perguntas, entre as quais se a Ana me disse algo sobre a depilação, se devia ser parcial ou total. E eu: “não é pra depilar nada!”. Aí ela disse que ia preparar o soro e ligar pra Ana pra perguntar. Antes que tivesse
ligado a Ana chegou e falou que já que o soro não tinha sido ainda colocado ela ia fazer uma tococardio antes. Veio o aparelho, ela começou o exame e logo colocaram o soro (15h00). Ela continuou acompanhando e aí disse: “Esse exame é importante também prá descartar circular de cordão.” Pensei: agora me danei de verdade... se ela mandar essa de circular de cordão a essa altura do campeonato eu vou entrar na faca tão rápido que já era... As contrações começaram a doer um pouquinho, ela mexeu um pouco na barriga (não tocou a sireninha), o exame continuou normal, ela disse estar tudo bem e tirou o aparelho. UFA! Saiu pra atender o celular, depois o Raul saiu pra trocar o carro de estacionamento, as contrações começaram a ficar bem fortes. Me ofereceram leite achocolatado, mas eu não quis pq estava sentindo náuseas durante as contrações.

Ela fez o primeiro toque – 6 prá 7 cm – perguntou se queria ir pro chuveiro - eu quis – inclusive porque tinha passado protetor solar antes de viajar e a essa altura já tinha suado bastante, me sentia suja. Foi uma delícia! O Raul ficou comigo, segurava o chuveirinho quando vinham as ondas e eu me acocorava – era ótimo, a dor ficava mais fácil de suportar. Não sei quanto tempo fiquei lá – acho que tive umas cinco ou seis ondas de dilatação - e só aceitei sair porque tinha outra moça na fila, que a minha médica estava acompanhando enquanto o médico dela foi auxiliar uma cesárea em outro hospital. Infelizmente ele chegou antes que eu tivesse liberado o banheiro e não deixou que a moça fosse também.

Quando sai do chuveiro tentei ficar de pé pra ajudar na evolução da dilatação, mas não consegui. Na primeira onda que veio senti tontura e me deitei bem rapidinho.Ondas mais fortes, espaço diminuindo – o Raul marcou – duravam 45 segundos e o intervalo durava 2 minutos. Eu suava... a médica ficava mexendo na minha barriga, aquilo me incomodava e eu não consigo entender porque raios eu não pedi pra parar. Pedi uma toalha pra enxugar o suor – desde o começo o Raul pegava toalhas de papel e me enxugava - mas eu achei que uma toalha seria melhor. Foi ótimo porque quando vinham as ondas eu enfiava o rosto na toalha e respirava fundo, ou tentava (na maioria das vezes sem conseguir), mas a toalha me ajudou muito.

A médica saiu um pouco e veio um cara, a enfermeira falou quem eu era, ele começou a fazer perguntas , eu respondi algumas, aí parei e perguntei: você é ...? “O anestesista.” - Ah... Ele falou que estaria à disposição pra quando fosse preciso. Aquilo foi uma porcaria porque a essa altura doía muito, e eu pensava: “não vou agüentar, não vou agüentar, quando passar eu vou pedir anestesia...” Aí passava e eu resolvia agüentar mais uma.



A médica voltou, falou que tinha conseguido reduzir o período obrigatório de observação do neném no berçário pra 3 horas (eram 6).Teve uma onda que doeu mais, eu tirei a mão dela da minha barriga e procurei a mão do Raul. Comecei a gemer. Ela pediu que eu avisasse quando sentisse pressão no intestino, “como se fosse vontade de ir ao banheiro”. Mais umas quatro ondas e eu senti a pressão. Ela fez o toque – 9 prá 10 cm – mandou preparar a sala. Saiu, voltou em seguida, falou que o pediatra que tínhamos combinado chamar estava em uma reunião, mas que a pediatra de plantão também era muito boa, que já tinha conversado com ela sobre o alojamento conjunto, etc. Tudo bem. Levantei e fui andando pro Centro Obstétrico.

Mal tinha saído do pré parto veio uma onda e eu fui me abaixando. A enfermeira: “não, não, não! Fecha a perna, fecha a perna!” e eu comecei a rir! Será que ela pensou que o neném ia cair?! Fiquei só meio abaixada, com os joelhos meio dobrados e rindo!

Passou, andei até lá, subi na mesa, ela colocou uma tabuinha almofadada debaixo do braço esquerdo (que tinha o soro), e me amarrou. Eu pedi: “não me amarra nãaaaao...”, e ela soltou. Continuou me posicionando, a médica chegou, falou que eu fizesse força durante as contrações, e pediu que inclinassem a mesa.

O Raul entrou, a roupa dele era azul, ela brincou que ele tinha ganhado uma roupa mais bonita que a dela. (17h30). Ela ainda olhou as perneiras, arrumou as almofadas, reclamou que não estava bom, mexeu de novo, até que ficou satisfeita, então me amarraram as pernas e puseram os campos. Acenderam o foco, ela falou que não queria, apagaram, e ela pediu que ligassem a música (Enya, eu acho...).

À partir disso eu estive praticamente o tempo todo de olhos fechados, e toda a memória que eu tenho do parto é auditiva. Pedi que ela esperasse o cordão parar de pulsar pra cortar, ela fez que sim, e quando a pediatra chegou transmitiu meu pedido. Todo mundo que entrou na sala falou comigo, me chamou pelo nome e se apresentou.

A médica pediu que preparassem a anestesia local – olhei pra ela e falei: “não corta muito não tá?” Ela disse que só cortaria se fosse preciso. Uma picadinha... O médico auxiliar chegou, eu já conhecia, era o mesmo que fazia as minhas ultras. Tentou escutar o coração do neném, reclamou que o aparelho parecia um rádio velho, foi buscar outro. Aí ele apertava aquilo na minha barriga, eu reclamei duas vezes que estava doendo, ele parou.

Aí de vez em quando ela enfiava a mão, doía pra C***... se alguém tivesse me oferecido anestesia eu teria lhe beijado os pés! Teve uma hora que a médica mexeu na minha barriga, doeu e eu segurei a mão dela antes que pudesse perceber o que fazia. Ela falou na maior calma: “Vânia, tenta não por a mão pra baixo porque você contamina o campo”. Depois o Raul contou que tiveram que trocar o campo e a luva dela. Ela enfiou a mão de novo, eu gritei: “Não faz isso que dóoooooooooooooi... tira a mão daí!” Ela tirou (!!!) e disse: “ se você não quiser eu não ponho, mas o que eu estou fazendo é pra te ajudar.”

Daí a pouco ela enfiou de novo, e eu: “Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaai Doutoraaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa”. Todo mundo riu, alguém comentou que eu era muito boa, que se todas fossem assim... Outra respondeu que eu era ótima. Isso me animou um pouco.

A médica começou a pedir que eu fizesse “força comprida”, acho que fiz coco porque senti ela me limpando duas vezes, mas não estava nem um pouco preocupada. Fazia força até que fosse imperioso respirar. Escutei ela dizendo: “Vânia, para de gritar e faz força”. Nem tinha percebido que estava gritando! As ondas de repente começaram a ficar fracas. Ela pediu que eu continuasse fazendo força e eu falei com uma voz infantilizada: “mas a contração já passou...”

O médico auxiliar se aproximou e falou que da próxima vez ele ia empurrar a minha barriga pra me ajudar. Gritei: NÃO QUERO! – a médica: “o que vc não quer?” – EU NÃO QUERO QUE EMPURRE A MINHA BARRIGA! - e ela na maior calma: “agora não pode demorar muito Vânia” – pediu então que inclinassem mais a mesa e disse: “pode inclinar, não vai cair não” (??) – pediu também que abrissem mais o soro. Falou pro Raul segurar minha cabeça alta. Decidi que da próxima faria força até desmaiar se fosse preciso. Minha impressão foi de que cheguei bem perto disso. Veio a onda e eu fiz fooooooorçaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa... Senti um PLUFT! Abri os olhos e lá estava o Batatinha! E tudo que eu consegui pensar foi: Graças a Deus eu não desmaiei. Ele foi colocado no meu peito, todo lambrecado e com um pouco de sangue. Falei com ele, dei boas vindas, beijei várias vezes, todos na sala sorriam.



A pediatra pediu licença, perguntou se podia levar um pouquinho, eu deixei depois de beijar mais um pouco. Quando passei ele pro colo dela ele chorou e ela disse: “não chora... eu não sou a mamãe mas eu sou boazinha também!” e ele parou. Depois começou de novo, e eu fiquei escutando ele chorar e pensando: a maioria das mães gosta de ouvir o filho chorar, mas eu sei o que estão fazendo lá... que M*... Ele voltou, tinham limpado o sangue, perguntei se tinham dado injeção – sim – e quanto foi o apgar? 9 e 10 – “dez antes mesmo de ter aspiradas as vias aéreas”. Aí ele foi levado pro berçário e eu comecei a tremer violentamente.



-Terceira e última parte -

Ele nasceu às 18h25 do dia 12/11/2003, pesando 3,625Kg e medindo 49 cm. Depois que foi levado pro berçário, comecei a tremer violentamente. A médica avisou que ia tirar a placenta. – Aaaaaaaaaaaaaai – que ia ver se não tinha ficado nenhum resto lá dentro... – Aaaaaaaaaaaaai – e pediu que eu relaxasse o quadril pra ela dar os pontos da episio.

Relaxar de que jeito?! Eu parecia um liquidificador! Ela perguntou se eu queria mais anestesia, perguntei: Quantos pontos serão? – “Dez, entre internos e externos. Não rasgou nem um pouquinho além do que eu cortei” Tá... aceitei mais anestesia. Depois avisou que ia passar o antisséptico (falou o nome), disse que era o que ardia menos, mas que ia arder um pouco. Eu já estava perdendo a paciência... - Quando penso que acabou ainda tem mais!! Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaai. E então tinha acabado.

Ela perguntou se estava tudo bem. – “Estou sem circulação nas pernas, tá doendo”. Já estavam me soltando. Ela desceu minhas pernas e fez um pouco de massagem. Fui levada pro quarto, ainda tremia.

Pedi pro Raul ir olhar o neném. Ele voltou e disse que ele estava na isolete, pertinho da janela do berçário, “de bundão pra cima e olhando tudo.” Logo veio uma canjinha pra mim, começamos a ligar pra família, liguei também pra Eleonora (amiga do meu parto) mas ela não estava em casa.Eu continuava com o soro, sei lá com que remédio, não lembro mais, e de olho no relógio. Liguei de novo pra Eleonora, o marido dela atendeu (Wlad – eu nunca tinha falado com ele): “Oi Vânia! E aí foi tudo bem? Parto natural?” Foi! Fiquei escutando ele comemorar aos gritos... “Pan, é a Vânia, foi parto natural!!” Ela veio.

Expliquei que não foi tão natural, que teve a indução, a episio... mas eu estava muuuuuito feliz e me sentindo muuuuito bem. Ela perguntou alguns detalhes, nos parabenizou, eu pedi pra ela mandar notícias pra Adriana e pra lista (Parto Nosso - derivada da Amigas do Parto).Aí já estava na hora de ver o Batatinha. Chamei a enfermeira. Ela disse que o período de observação seria de 6 horas. – MAS no meu caso esse período foi reduzido pra 3. Então o trouxeram. Lindo, cabeludo, bochechudo, pegou o peito super bem, de primeira, e me olhava com aqueles olhos azuis de recém nascido. Fiquei deliciada!

AMOR! amor, amor, amor, amor...


Depois de parar de mamar ficou no meu colo. O cansaço chegou, o Raul também muito cansado. Dei o braço a torcer. Eu tinha autorização pra alojamento conjunto, mas quando a enfermeira veio buscar eu deixei levar. Aí veio uma enfermeira e tirou o soro, depois me ajudou a tomar banho. Já era mais de meia noite.Dormi super pouco, mas super bem. Sentindo-me totalmente desperta pensei em mandar trazê-lo de volta, mas eram só 3h da manhã! Parecia que eu tinha dormido 3 dias. O parto começou a passar na minha cabeça como um filme, eu lembrava das minhas reclamações e dos gritos e ria baixinho. Às cinco da manhã ele veio, mamou de novo e ai ficou comigo. Teve “aulinha” de banho e de cura de umbigo no berçário. Lotado! Disseram que tinha mulher espalhada por outros setores do hospital pq os quartos da maternidade acabaram. Surpresa deliciosa: no meio da manhã e no meio da tarde passou um cara tocando violino – tocou aquela música do Titãs: o acaso vai me proteger... (não sei o nome), Eu sei que vou te amar e A noite do meu bem. AMO esta música. Derramei umas lagriminhas... Agora pelo resto da minha vida, cada vez que escutar uma destas 3 músicas maravilhosas vou lembrar daquele momento mágico onde “dei à luz” um menininho saudável, perfeito e gordinho.

Às 4 da tarde a médica veio e me deu alta. Eu já estava andando pelo corredor pra estimular o intestino a funcionar. Tinham me dado “um laxantezinho”, e em todas as refeições veio mamão. Comecei a achar que minha alta dependeria disso – pura viagem. Conversei com ela ainda no corredor, fiz umas perguntas. Falei que senti as contrações – óbvio – mas não senti nenhuma dor da saída dele – só das mãos dela, aquilo doía demais! Ela disse que tinha ficado preocupada com o tamanho dele, e que punha as mãos pra se certificar que ia passar. Fez um gesto com as duas mãos segurando uma bola e rodando, e completou dizendo que se as mãos dela tinham espaço pra rodar em volta da cabecinha, então ele ia passar. Putz... Percebi que realmente ela esteve com muito medo. E quanto a não perceber a saída dele, ela disse: “eu sei... quando você falou que a contração tinha passado, era porque ele já estava metade pra fora”.

Já estava com tudo arrumado pra ir embora quando a Eleonora chegou. A única visita que recebi e amei conhecê-la pessoalmente, depois de tantos e-mails e telefonemas em busca de um parto mais digno.

Menos de 24 horas após o parto estávamos na estrada a caminho de casa.

Capacidade de adaptação às limitações impostas pelo meio
Considerações posteriores: apesar de ter sido muita sofrida, na época, a decisão de aceitar a indução do parto, penso que fiz a melhor escolha. Depois fiquei sabendo que as Casas de Parto exigem acompanhamento à partir da semana 37 e eu já estava entrando na 39. E nunca consegui saber se a minha gestação era considerada ainda de baixo risco, porque tinha algumas alterações nos ultra-sons que eram “indícios de possível má formação fetal”. Se eu tivesse ido para São Paulo o Raul não poderia ir comigo. Ele teria que ser chamado quando o trabalho de parto tivesse se iniciado e correria o risco de não chegar a tempo, e além disso, sair pra estrada muito ansioso definitivamente não é boa idéia. Nada disso era claro na minha cabeça na hora de decidir. Eu apenas tinha vontade de lutar um pouco mais por um parto humanizado mas, tinha a sensação de não daria certo e que a indução era minha melhor chance. Confiei nisso e funcionou. Ainda bem!

Do que me arrependo: de ter cedido na questão do alojamento conjunto, de ter deixado darem o banho, de ter deixado darem a injeção... Não tive forças prá lutar por cada detalhe e essas coisas escaparam ao meu controle. (O neném teve impetigo (infecção de pele) contraído no berçário, e com uma semana precisou tomar antibióticos.)

Conclusão: ainda precisamos lutar muito para melhorar as condições de atendimento às gestantes e parturientes no nosso país, porque por mais informada que uma mulher possa ser, na hora do parto fica praticamente impossível conquistar condutas humanizadas se elas já não forem rotineiras. Eu agora faço parte dessa luta!"

Vânia Bezerra
psicóloga com aprimoramento em psicologia hospitalar, educadora perinatal e doula